A Lui Cinematográfica realiza o 12º Festival do Filme
Italiano a partir de quinta-feira. Os filmes terão sessões às 15h e 19h30 nas
quintas feiras até o dia 4 de outubro, sempe no Multiplex Topázio do Shopping
Jaraguá.
A mostra será aberta por “Habemus Papam”, de Nanni Moretti, que já foi exibido pelo Cineclube
Indaiatuba em abril. Um personagem num posição inusitada que sofre um surto de
síndrome do pânico e é obrigado a se submeter em segredo a sessões de
psicanálise foi o ponto de partida tanto da comédia “A Máfia no Divão” (1999)
quanto o seriado “Família Soprano” (1999-2007). Em ambos os casos, o paciente
em questão era um chefão da Máfia e no filme de hoje, o lider de outra
instituição tipicamente italiana, o Vaticano. O grande ator francês Michel
Picoli (“A Bela da Tarde”, “A comilança”) interpreta o papa que, na hora de
surgir aos fiéis que aguardavam a eleição do Colégio de Cardeais como novo
Santo Padre, tem um surto de pânico e recua. Como ele já aceitou o cargo, o
protocolo da Igreja Católica cai num impasse. O que fazer? O papa assume ou não
o cargo? A imprensa de todo o mundo pressiona para saber o nome do eleito.
O porta-voz do Vaticano, interpretado pelo ator polonês
Jerzy Stuhr (colaborador de Krzysztof Kieslowski em trabalhos como “A igualdade
é branca”) é obrigado a se desdobrar para manter a mídia longe do imbróglio e
se manter dentro dos parâmetros rituais. Um médico e chamado, mas logo se vê
que é um trabalho para a Psicanálise, e justamente um terapeuta ateu (Nanni
Moretti) entra em cena, em meio de um grupo de cardeais de vários países.
Enquanto o papa entra em crise existencial, pois não se julga apto para o
cargo, o psicanalista e os cardeais, todos impedidos de deixar o Vaticano por
causa do segredo a ser mantido, dedicam-se a jogos como carteado e um torneio
de vôlei, onde fica escancarado o peso da geopolítica na distribuição de forças
dentro da Santa Madre Igreja Católica.
Não
vendo muito progresso com o terapeuta, o porta-voz resolve levar o Sumo
Pontífice para fora dos muros do Vaticano para se consultar com uma
psicanalista mulher (Margherita Buy, de “O quarto do filho”). Dessa vez, o papa
é tocado pela conversa e foge, se perdendo pelas ruas de Roma e indo parar num tearo em que um grupo interpreta “A
gaivota”, de Tchecov. Como observa o crítico Marcel Hessel, do site Omelete, “Assim
como Tchékhov, Moretti também tem gosto pela sátira que fica entre o trágico e
o cômico”. “A grande sacada aqui, que faz a ponte com Tchékhov, é revelar que
Melville sonhava ser ator - uma frustração da juventude, ‘já que eu era péssimo
no palco’, diz ele. O que o papa talvez não perceba (mas Moretti faz questão de
dizer) é que o papado é também uma forma de encenação”, prossegue.
Nanni Moretti é um dos raros diretores do cinema italiano
atual que é rapidamente identificado, graças a trabalhos como “Caro Diário”
(1993) e “O quarto do filho” (2001), ambos premiados em Cannes, o primeiro lhe
dando o troféu de Direção e o segundo obtendo a cobiçada Palma de Ouro como
melhor filme.
Sobre “Adorável
Pivelina”, filme que será exibido dia 21, segue avaliação do crítico de O Estado de S. Paulo, Luiz Zanin.
Na primeira sequência de Adorável Pivellina, uma mulher já de certa idade, Patti
(Patrizia Gerardi), procura por seu cão num jardim. A câmera (na mão) a
acompanha. Patti não encontra o cachorro fujão (ele reaparecerá depois), mas
acaba por achar uma criança sozinha, num balanço, a garotinha de que fala o
título em italiano.
A mãe deixou um bilhete e
uma foto, e mulher resolve adotar a pequena Asia (Asia Crippa), apesar da
insistência do marido, Walter (Walter Saabel) em entregar o caso à polícia.
Casal de artistas de um cirquinho mambembe, nota-se que tem grandes dificuldades
para ganhar a vida. Patti, no entanto, se afeiçoa à garotinha e a integra à
vida da pequena trupe.
O filme embarca logo de
saída em um tom documental que não deixa de surpreender o espectador. Muitas
cenas são como que registradas em tempo real, como se perguntassem ao público,
mas, afinal, onde está a história?
Ora, como sabemos, muitas
vezes a graça da coisa reside, exatamente, na observação do acontecimento
vivido, nessa espécie de simulacro “da vida como ela é”, tão rente ao real
quanto seja possível ao cinema. No caso, o cotidiano desses personagens de um
circo pobre, que, por acaso, se situa na Itália, mas poderia ser em qualquer
lugar, e aqui mesmo, no Brasil.
A situação é universal e, ao mesmo tempo,
italianíssima. Tudo se passa nos arredores de Roma, naqueles arrebaldes meio
desolados, cheios de edifícios populares e que foram locação favorita de alguns
filmes de Pier Paolo Pasolini. A referência a Pasolini, aliás, se amplia num
passeio à feia praia de Óstia, onde ele foi assassinado por um garoto de
programa, em 1975.
De qualquer forma, é sempre um desafio para o diretor (no caso uma dupla, o austríaco Rainer Frimmel e a italiana Tizza Covi) manter o interesse do espectador num projeto como este.
De qualquer forma, é sempre um desafio para o diretor (no caso uma dupla, o austríaco Rainer Frimmel e a italiana Tizza Covi) manter o interesse do espectador num projeto como este.
Eles vencem a aposta com
uma série de trunfos nas mãos. Primeiro, a criança é encantadora, de fato. Mas,
se sabe, péssimos filmes também são feitos com crianças adoráveis. É que, no
caso, os “dotes” da menina Ásia Crippa são utilizados com inteligência pela
dupla. Há, também, a espontaneidade dos atores naturais, que fazem os
personagens como se interpretassem as próprias vida, o que é bem caso. Em
especial, a figura de Patti, com seus cabelos vermelhos e ar protetor de mamma
romana. Com diálogos improvisados, o filme adquire frescor notável.
Por fim, introduz-se um
elemento de suspense em toda essa situação. Quem será essa mãe, que abandonou a
“pivellina” encantadora, ou, pelo menos, a deixou emprestada por algum tempo à
outra? Essa pergunta fica implícita, rondando o filme e, embora não formulada
de todo, lhe dá um dinamismo psicológico notável. Não conseguimos evitar a
pergunta implícita: e com quem ficará a pequena no final?
No dia 28, a atração será “A primeira coisa bela”, resenhada abaixo pelo decano Rubens Edwald Filho.
Felizmente ainda tem
distribuidores que tentam lançar filmes italianos no mercado brasileiro apesar
das dificuldades. Antigamente a gente conhecia todos os astros da Itália que
eram enormemente populares por aqui .
Infelizmente o cinema lá
enfrenta dificuldades econômicas, aliás, como todo País e não reconhecemos os
nomes ou os rostos (uma das poucas sobreviventes da Idade de Ouro do cinema
italiano é Stefania Sandrelli, que era adolescente quando foi revelada em Divórcio
a Italiana, de Pietro Germi, e hoje faz papeis de matrona, ainda bonitona por
sinal).
Não há como negar que o
cinema italiano já não tem mais o mesmo padrão de qualidade, de uma época em
que exibia os melhores fotógrafos, os melhores diretores de arte e mesmo
compositores. O cinema deles tinha uma cara e um padrão, que hoje se perdeu.
Mas ainda tem características próprias, continua ser a humano, popular,
intensamente crítico e dramático sem cair em clichês.
Dentre seus novos valores
descobertos pelo Festival de Cannes está este Paolo Virzi (este já é seu décimo
terceiro trabalho como diretor e segundo me parece vimos apenas um deles no
Brasil, que foi “Meu Caso com o Imperador”, 06, com Daniel Auteil e Monica
Belucci, que está longe de ser o mais característico e pessoal, mas que eu
descrevi como “Boa comédia italiana que conta em tom de farsa, como teria sido
a estadia do Imperador Napoleão na Ilha de Elba em seu exílio, depois de
Waterloo.
Esta nova comédia dramática
foi super premiada, ganhou três Davids de Donatello (ator, atriz e roteiro), e
mais 15 indicações, ganhou festivais de Salerno,Sannio e Montpellier, foi
finalista como diretor no European Film Award. Além de ter sido indicado
oficialmente ao Oscar de filme estrangeiro.
Basicamente pinta o retrato
de uma professor de curso secundário de cerca de 40 anos, misantropo e que é
forçado a visitar sua mãe de quarenta e poucos anos, que esta para morrer. São
quatro décadas de problemas e crises que ele tem que resolver. Os críticos
americanos acharam que o filme não foge de certo sentimentalismo semelhante aos
trabalhos de Tornatore, ainda que compensado por grandes interpretações de todo
o elenco.
O filme começa em 1971, num
concurso de beleza de verão, em que Anna (Ramazzotti, que na vida real é mulher
do diretor) ganha mas deixa o marido enciumado e o casal de filhos observando.
No tempo presente, o garoto
virou o professor e é praticamente sequestrado pela irmã Valeriz (Pandolfi)
para visitar a mãe que está morrendo de câncer num asilo. Dali em diante, o
filme alterna passado e presente, explicando aos poucos como o herói foi
ficando traumatizado e amargo.
Sem cair na caricatura,
como muitos filmes italianos dantes e de hoje, A Primeira Coisa Bela usa como
título uma canção popular de 1970 que a mãe cantava para suas crianças em
momentos de problemas (a trilha musical é do irmão do diretor Carlo Virzi). O
fotógrafo Nicola Pecorini usa cores laranja e sépia para o passado.
Enfim, é
um filme de emoções, sentimentos que tem
grande chance de dialogar com o público brasileiro, em particular o paulistano.
Fechando a mostra, no dia 4 de outubro será exibido o “clássico”
“Dio como ti amo”. Clássico entre
aspas porque não o é no sentido estrito do termo – um filme memorável por sua
qualidade – mas por ter marcado época, especialmente em Indaiatuba, por razões
diversas. Feito na esteira do sucesso da canção de autoria de Domenico Modugno,
vencedora do Festival de San Remo em 1966, e que tornou a cantora Gigliola Cinquetti
uma estrela internacional. Como na época se consumia tanto músicas quanto
filmes italianos em profusão no Brasil, multidões foram assistir “Dio come ti
ano” no País. Gigliola interpreta uma bela e inocente jovem de família pobre
que se apaixona pelo noivo rico de sua melhor amiga. Emocionados com a paixão
da moça, seus familiares a fazem se passar por uma princesa para que ela possa
viver este romance impossível. Destaque para a o clímax no aeroporto, quando
ela toma o microfone da torre de controle e canta a música-título para o amado
que está em um avião. Brega? Sem dúvida, mas fazia o antigo Cine Alvorada ser
inundado por lágrimas de donas-de –casa em sessões vespertinas patrocinadas por
uma marca de sabão em pó.