segunda-feira, 30 de julho de 2012

Mulheres em Acorde no Shopping Jaraguá

O show do Mulheres em Acorde sexta-feira no Shopping Jaraguá foi, como se esperava, um sucesso, e consolida essas atrações musicais como um instrumento para a fidelização do público para o mall do Centro. Kika Baldasseirini, Monica Ávila, Sara Bonfim e Sonia di Morais desfilaram as canções que fizeram mais sucesso ao longo da carreira do grupo, abrindo, inclusive, com "Pagu", de Rita Lee, que havia ficado fora das últimas apresentações.
Um detalhe que me chamou a atenção é que às 20h, hora marcada para o show, a praça de alimentação do Jaraguá ainda tinha diversas cadeiras vagas. Só às 20h30 a lotação esgotou. É o famoso "horário brasileiro":  público e organizadores sabem que o negócio só começa meia-hora depois.
Para quem perdeu, domingo elas voltam a cantar, só que em Campinas, no Teatro do Sesc, às 15h, também com entrada franca
As Mulheres em Acorde encantando o público do Jaraguá

Kika Baldasseirini e Sara Bonfim

Mônica Ávila e Soninha di Morais

As cantoras com a excelente banda

Ariadne e Ariane Campos curtindo o Mulheres em Acorde

Os atores Fernando Almeida e Fernanda Bugallo, que vão participar da montagem de A Ópera do Malandro

As psicólogas Isabela Vargas e Erika Vendramini com Cláudio e Mônica

Os amigos  Julia, Mary, Rafaela e Guilherme

Bianca Baldasseirini Wolff foi ver a mamãe Kika cantar ao lado do marido Juliano Henrique

Ana Laura entre as irmãs (gemeas?) Lais e Ligia

Menininhas deram um show a parte em frente ao palco

Rafaella Calonga promovendo a Feira de Noivas do Jaraguá e a Nishi Royale a caráter



quinta-feira, 26 de julho de 2012

Sobre o obelisco da rotatória do 'Teiadão'

A Prefeitura anunciou o início das obras de reconstrução do obelisco que ficava na rotatória da Avenida Conceição, em frente ao Instituto de Reabilitação e Prevenção em Saúde Indaiá (IRPSI), o popular Telhadão. Reproduzo a seguir o texto que escrevi na Tribuna de Indaiá a respeito da destruição da obra de José Paulo Ifanger, nosso mais importante artista plástico contemporâneo, e o comentário feito após a promessa feita pelo prefeito Reinaldo Nogueira na Rádio Jornal, após a denúncia da imprensa e intensa mobilização nas redes sociais.



Obra de José Paulo Ifanger vai parar no lixão

Prefeitura diz que consultou Pró-Memória mas presidente diz que não sabia

Marcos Kimura

Restos do monumento jogados no lixão
O obelisco da rotatória da Avenida Conceição, em frente ao Instituto de Reabilitação e Prevenção em Saúde Indaiá (IRPSI), o popular Telhadão, desapareceu de um dia para o outro. Obra do artista plástico José Paulo Ifanger, falecido no final de 2011, a obra foi inaugurada nos anos 80 para marcar a inauguração da Avenida Conceição. “Para o Zé Paulo, ela representava o progresso que a cidade vivia então, que era representada pela abertura daquela avenida perimetral, quase um mini-rodoanel da cidade”, explica o ex-prefeito José Carlos Tonin, que encomendou o obelisco. “Quando minha mulher contou que iam por a obra abaixo, achei que era brincadeira. E agora, esta semana, derrubaram mesmo”, conta.
A arquiteta Ana Paula Ifanger Sinisgalli, filha de José Paulo, diz que ganhou um triste presente de aniversário, que foi na última terça-feira. Em sua página na rede social Facebook, ela manifestou sua indignação com a “falta de respeito à arte e à cultura da nossa cidade”, recebendo a solidariedade de diversos amigos. Ela disse à Tribuna que a família está desolada com o descaso. “Imagine se meu pai estivesse vivo. Quando pintaram o obelisco de uma cor feia ele foi lá, levou uma foto pra usarem um cor melhor. Agora botaram tudo abaixo!”, diz.
Em nota oficial, o secretário de Obras, José Carlos Selone, “informou que a retirada do monumento foi necessária para a implantação do projeto de trânsito na confluência das avenidas Conceição e Bernardino Bonavita. Ele ressalta que a obra tem como objetivo melhorar a fluidez do trânsito no local e, consequentemente, tornar o trecho mais seguro para condutores de veículos e pedestres, considerando que  acidentes graves já foram registrados naquele ponto da cidade.”
A reportagem perguntou, por meio da Assessoria de Comunicação da Prefeitura, se não foi levada em consideração que se tratava de uma obra de arte ou se cogitou sua transferencia para outro local. A resposta foi que A Prefeitura solicitou uma avaliação por parte da Fundação Pró-Memória, que concluiu que a remoção e transporte do monumento da rotatória da Av. Conceição para outro local na cidade despenderia de alto custo, por isso não foi feito. Procurado pela Tribuna, o presidente da Fundação Pró-Memória, Antonio Reginaldo Geiss, disse que não sabia da remoção do obelisco nem que ele era de autoria de José Paulo Ifanger.
A Tribuna perguntou ainda à Prefeitura se uma outra obra de José Paulo Ifanger, que fica na rotatória das Avenidas Conceição, Presidente Kennedy e Engenheiro Fábio Barnabé, também poderia desaparecer com a reforma que será feita lá, e a resposta foi que o projeto ainda não está pronto e, segundo o secretário de Obras, o objetivo inicial é não mexer nos monumentos, mas, em alguns casos, a mudança se faz necessária para melhorar a segurança no trânsito.
Inconformado
O conselheiro e fundador da Fundação Pró-Memória de Indaiatuba, Antonio da Cunha Penna, diz que não se conforma com a falta de respeito da Prefeitura em relação à entidade, que só é reconhecida em relação à guarda de fotografias velhas e do Arquivo Público. Mas nas demais atribuições relativas à Memória, não somos consultados para nada.“Por exemplo, a fachada do centenário Cemitério Velho foi mudado sem nenhuma consulta”, lembra.
“Na terça-feira, durante a reunião do Conselho Deliberativo, coincidentemente  manifestei meu descontentamento com essa falta de respeito e no dia seguinte tive essa confirmação, quando fiquei sabendo que o monumento, que é um bem público, obra de um artista indaiatubano importante, foi destruído. Outros monumentos do artista José Paulo Ifanger, bem como o nosso pontilhão Fepasa são bens públicos sujeitos a terem o mesmo destino. Como se não bastasse a falta de instrumentos legais para se preservar bens particulares, dos quais restam bem poucos, como a casa do Major Alfredo da Fonseca, que até recentemente estava preservada e foi descaracterizada por uma reforma. (Publicado em 3 de setembro de 2011)

A César o que é de César e ao povo o que é do povo

O obelisco original
Não pretendia retornar ao assunto, mas já que o prefeito Reinaldo Nogueira resolveu consertar o erro, retomamos o assunto. Para quem não sabe, em entrevista na quarta-feira à Rádio Jornal – em cujos estúdios ele se sente cada vez mais “em casa” – nosso alcaide reconheceu que houve um erro e que vai reconstruir o obelisco da rotatória do Telhadão em local próximo. A informação foi confirmada pela Assessoria de Comunicação Social da Prefeitura. Lógico que ele não citou a Tribuna de Indaiá em sua fala, mas é inegável que o barulho provocado pelo jornal acendeu o debate que pegou fogo pela Internet, principalmente no Facebook, onde surgiu uma nova comunidade, Indaiatuba Ativa, criado na segunda-feira e que até quinta-feira já tinha 278 membros.
À exemplo do Doutor Hélio, quando quis desqualificar a votação do seu impeachemnt, o prefeito Reinaldo Nogueira disse que a movimentação em torno do assunto era “política”. Ora, mas certamente que é. Tudo o que se refere à vida da cidade é política, ou  “arte ou ciência da organização, direção e administração de nações ou Estados; aplicação desta arte aos negócios internos da nação (política interna) ou aos negócios externos (política externa). Nos regimes democráticos, a ciência política é a atividade dos cidadãos que se ocupam dos assuntos públicos com seu voto ou com sua militância.”
Então, quando cidadãos protestam e debates assuntos relativos é cidade é sempre política, independente de partidos. O fenômeno Internet permite que as mobilizações aconteçam em tempo muito curto e que os assuntos repercutam em tempo real. Mas ainda assim, um “empurrãozinho” das mídias tradicionais são necessárias, como se ve nesse caso e no impeachment do Doutor Hélio.
O prefeito de Campinas caiu nem tanto por conta da mobilização de seus opositores, mas pela indignação dos cidadãos diante da gravidade das denúncias do Ministétrio Público, suficientes para que a Justiça decretasse prisão temporária de vários denunciados, inclusive o vice-prefeito Demétrio Vilagra, atualmente (na época) no comando do Executivo. Tudo com uma cobertura histórica dos meios de comunicação, principalmente da EPTV, que mudou a habitual pauta “água com açucar” de seu telejornal vespertino para bombardear o espectador diariamente com repercussão do caso ou com novas denúncias. Mesmo que nada ligasse diretamente o nome de Hélio de Oliveira Santos aos escândalo da Sanasa, o envolvimento de sua esposa, tida como chefe da quadrilha, provocou o seu impeachment. “Não basta à mulher de César ser honesta, ela tem que parecer honesta.”
Em Indaiatuba, a destruição do obelisco é um elemento a mais dentro diversos outros assuntos, como o muro milionário da Câmara erguido por empresas fantasmas e a desapropriação pelo Município de terreno do próprio prefeito – tudo denunciado e apurado pela imprensa – , e que vem causando uma crescente indignação pública manifestada na Internet. A reconstrução do monumento é, certamente, uma vitória da mobilização pública apartidária em conjunto com a mídia. Mas ela não deve ficar restrita a isso. A luta para contruir a cidade que sonhamos, mais humana, mais segura, com maior transparencia, passa pela informação, discussão e ação.
PS: fora o custo da reconstrução que vai recair sobre os impostos que todos pagamos, não vejo nada de errada na reconstrução, já que se trata de um projeto do artista José Paulo Ifanger e não uma escultura. Da mesma forma, a manutenção do muro de taipa do Pau Preto, que na verdade ruiu há muitos anos atrás, também é importante pela questão simbólica. No Japão, o Templo de Ise, erguido em madeira há 1500 anos e que é reconstruído a cada 20 anos seguindo o projeto e método originais. Então, a mais antiga estrutura civil da cidade merece ser também ser preservada pelo mesmo método, como testemunha de nossas origens.(Publicado em 17 de setembro de 2011)



terça-feira, 17 de julho de 2012

Segunda-feira de gala no cinema


Nesta segunda-feira, fiz programa duplo de cinema, assistindo quase na sequencia "Na Estrada", de Walter Salles; e “Sombras da Noite”, de Tim Burton. Dois grandes filmes, mas completamente diferentes.
Vamos começar pelo fim. “Sombras da noite” é, como Pedro de Queiroz comentou no Facebook, “ reúne o melhor de ‘Batman Returns’, ‘Ed Wood’ e ‘Sleepy Hollow’ e vai até além”. Para quem conhece o Pedro – um cinéfilo com um olhar muito pessoal, mas fundamentado – sabe que esses são seus Burtons preferidos. E acho que meus também.
A produção foi uma iniciativa de Johnny Depp, fã da soap opera original, que, segundo Pedro, chegou a ser exibido no Brasil com o título “Sombras Tenebrosas” (Cortesia de sua memória prodigiosa. Isso você não acha nem no Google). Embora seja da mesma geração, não assisti, mas intuo que Burton manteve as reviravoltas típicas do gênero do original. Curiosamente, quase ninguém da crítica especializada se deu conta das qualidades do filme, que se não for o melhor de Burton, certamente é o melhor pós-“Planeta dos Macacos” (e olhe que isso inclui os notáveis “Peixe Grande e suas Histórias Maravilhosas” e “Sweeney Todd”). Acho que a principal dificuldade foi “encaixar” a obra num gênero: É terror? É “terrir”? Não, é uma soap-opera dark, como o original.
Depp é novamente o outsider, como em todas as suas colaborações com Tim Burton. De novo, Helena Booham-Carter é a amante-cúmplice-ocasional, como em “Peixe grande e suas histórias maravilhosas” e “Sweeney Todd”. Michelle Pfeiffer, que viveu um dos seus grandes momentos no cinema como a Mulher-Gato de “Batman – O Retorno”, deve ter sido escalada só para dizer a memorável linha “You'll have to imagine us on a better day”. Mais “Crepúsculo dos Deuses” impossível.
Pedro refere cena de sexo entre Barnabas e Angelique a “Batman – O Retorno”, mas lembra também o longo beijo entre Ingrid Bergman e Cary Grant em “Interlúdio” e, replicado pelo próprio e Eve Marie-Saint em  “Intriga Internacional”, em que Hitchcock aplica um grande drible no Código Hays. A referência ao Ciclo Poe de  Roger Corman, de fato, é quase explícita. A participação de Christopher Lee é interessante. Da mesma forma como Ed Wood ressuscitou o ex-Drácula Bela Lugosi, Tim Burton trouxe à tona o Vampiro da Noite da Hammer em “A Lenda do Cavaleiro Se Cabeça” (só depois desse é que ele foi chamado para as trilogias “Star Wars” e “Senhor dos Anéis”), “A Fantástica Fábrica de Chocolate” (como... dentista!) e agora sendo possuído por um vampiro.
Manter a ação nos anos 70, ao invés de atualiza-lo aos dias atuais foi um achado. As referencias pop – especialmente na música – são sensacionais, coroada pela participação de Alice Cooper (“A mulher mais feia que já vi”, segundo Barnabas Collins). Barry White, T. Rex, Carpentes (“Do you mean to say that she has a penchant for woodworkers?” Sensacional!) e Elton John compõe a colagem musical do filme, algo raro para Tim Burton, que em geral prefere trilhas musicais originais. Mas as canções não apenas dão fundo musical, mas também comentam a ação (“No more, Mr. Nice Guy”, “I’m sick of you”). 

***

 “On the Road”, romance seminal de Jack Kerouac, seria para a Geração Beat o que “Acossado” foi para a Nouvelle Vague. Se Walter Salles não foi fiel à narrativa propriamente dita – e quem poderia? – conseguiu extrair em sua obra o espírito do romance e o período em que se passa, com muito sexo, drogas e bebop, a trilha sonora oficial dos beatniks.  É um dos melhores trabalhos do diretor, do nível de “Terra Estrangeira”, “Central do Brasil” e “Abril Despedaçado”, só que desta vez com um elenco internacional recheado de nomes de prestígio, como Kirsten Dunst, Viggo Mortensen, Amy Adams, Steve Buscemi, além do trio central formado por Sam Riley, Garret Hedlund – que mostra um talento insupeito para quem viu “Tron 2” – e Kristen Stewart, num trabalho no mínimo corajoso para quem é um ícone da sociedade de consumo adolescente.
Escrevi anteriormente que o livro foi publicado no Brasil pela Braziliense, mas diversas fontes dão conta de que foi pela gaúcha LP & M, com tradução de Eduardo “Peninha” Bueno, o que faz muito sentido. Devo ter sido traído pela memória porque, na época, praticamente tudo o que era relevante foi publicado pela Brazileinse, então dirigida pro Luiz Schwarcz, futuro Companhia das Letras.
Anyway, assistindo o filme, veio-me a lembrança o período em que li o livro, meados dos anos 80, uma época em que vários elementos da história estavam na moda no Brasil, incluindo a literatura beat. O bebop estava sendo redescoberto, na época, os únicos discos disponíveis do gênero eram os da Imagem, praticamente piratas, com péssima qualidade sonora, muitas vezes gradas ao vivo com equipamento amador, mas que revelavam a genialidade de Charlie Parker, Dizzy Gillespie e companhia. Logo, a loja de discos Breno Rossi começaria a lançar edições de melhor qualidade, incluindo Miles Davis, Duke Ellington e outros gigantes do jazz. Não foi à toa que foi na época que começou o saudoso Free Jazz Festival. Outra coisa que talvez passe batido por alguns é a cabine de orgone de Old Bull Lee, originário das teorias de Wilhelm Reich, outra moda dos anos 80 (na verdade, da virada dos 70 para os 80) no Brasil.
Nessa mesma, época eu estudava Psicologia e escrevi um trabalho para o professor João Augusto Freyze Pereira (autor de “O que é loucura”, da coleção Primeiros Passos) tentando estabelecer o fenômeno da moda das literaturas noir (Dahiell Hammet e Raymond Chandler) e beat com o período contemporâneo no Brasil. Era muita ambição intelectual, mas ele gostou do tema, mesmo tendo pouco a ver com o que ele estava ministrando.
A coisa em comum entre os escritores noir e os beat era o fato de serem do pós-guerra – a Primeira Guerra para Hammet e a Segunda para Kerouac e companhia. E os anos 80 no Brasil? Bom, não vínhamos de um conflito global, mas de uma ditadura militar que, se não teve a dimensão das “guerras sujas” no Chile e Argentina, deixou cicatrizes profundas, que perduram até hoje. Nós que entramos na universidade no início dos anos 80, convivíamos com veteranos das passeatas de 1977, provocadas pelos assassinatos do jornalista Wladimir Herzog e do operário Manuel Fiel Filho. Esses, por sua vez, tinham como gurus e ídolos os caras que tinham ido para a luta armada, alguns mortos e desparecidos e outros exilados. Com a abertura política e posterior redemocratização, nossa geração ficou entre o engajamento político e o hedonismo do sexo, drogas e roquenrol. Daí a curiosa identificação com o frenesi sensorial dos beat e o desencanto e cinismo de Hammet com as “causas” (ainda que ele tenha se negado a dedurar seu antigos companheiros de Partido Comunista, mesmo que não acreditasse mais em Marx.). Para nós, egressos dos anos de chumbo que apenas vimos de relance, havia o peso desse passado recente, mas também a perspectiva de um porvir sem palavras de ordem, mais livre em todos os sentidos. Talvez por isso nos identificássemos com os beatniks, mesmo separados deles por quatro décadas. 

terça-feira, 3 de julho de 2012

As efemérides de dois clássicos sci-fi


Este ano se completam os 35 anos do lançamento de “Star Wars – Episódio IV”, na época ainda “Guerra nas Estrelas”, e os 30 anos de “Blade Runner”, cujo subtítulo brasileiro, “Caçador de Andróides”, foi rapidamente esquecido.
O impacto do primeiro foi gigantesco na época do lançamento, a ponto de se considerado um turning point da indústria de Hollywood, enquanto o segundo só conseguiu construir sua reputação ao longo dos anos, já que foi um retumbante fracasso na estreia. Uma das vantagens de ser um velho é ter assistido ao lançamento dos dois no cinema, duas das mais expressivas experiências cinematográficas em minha vida de cinéfilo.

Há muito tempo, numa galáxia distante

Poster que foi usado no lançamento no Brasil
A única coisa que vi que mais ou menos reproduz o impacto que foi “Guerra nas Estrelas” em seu lançamento no cinema foi um episódio de “That’70s Show”, em que o bando de Eric Forman fica boquiaberto na abertura do filme. Nunca antes no cinema uma nave espacial demorava 30 segundos para passar pela tela. Até então, as espaçonaves do cinema eram maquetes do tamanho de pratos, que cuspiam fagulhas pela cauda, imitando a propulsão de foguete. George Lucas inovou com seus modelos enormes, cheios de detalhes, que davam uma sensação de realismo inédita até então (Ok, no espaço, o som não se propaga, mas quem estava prestando atenção nisso?). Sem falar na criação de um dos melhores vilões de todos os tempos: Darth Vader, com sua máscara com frente de carro esporte, capacete de nazista, respiração de asmático e sempre à bordo de seu pretinho básico.
Que garoto não sonhava com uma aventura que misturasse capa e espada, aventuras espaciais e até um toque de samurais? Além da Ordem Jedi ser uma mistura de Cavaleiros Templários com filosofia zen, e seu estilo de luta lembrava mais os duelos de guerreiros japoneses, uma das inspirações confessas de Lucas foi o filme “A Fortaleza escondida”, de um jidai gekki (filme da época dos samurais) de Akira Kurosawa. E onde Star Wars se parecia com essa produção nipônica? Porque a história era narrada seguindo a trajetória de dois personagens periféricos na grande trama principal, no caso, os dróides C3PO e R2D2.
Lucas ainda seguiu as diretrizes do mestre Joseph Campbell a respeito dos mitos, e criou uma mitologia própria que é seguida com fervor até hoje, em pleno século seguinte. Fez a ficção-científica voltar à ordem do dia – foi indiretamente responsável por levar o seriado “Jornada nas Estrelas” ao cinema – e fez com que o foco das grandes produções se voltasse ao público adolescente, a ponto de, nos anos 80, Paulo Francis parodiar a célebre frase “não confie em ninguém com mais de 30 anos” com “a Hollywood de hoje não confia em ninguém com mais de 15 anos de idade mental”.
Recentemente, relançou o "Episódio 1" em 3D, numa tentativa de apresentar sua saga às novas gerações. Não cheguei a ver porque tinha acabado de rever o filme na TV por assinatura, e a cada revisão ele fica pior. A explicação dada para incluir os dróides é estúpida. No primeiro filme, quando eles são capturados pelos Jawas, dá-se a entender que eles são artigos de ponta, e não velharias como seriam se tivessem mais de 20 anos de construção. 

“Todas essas lembranças ficarão perdidas no tempo, como lágrimas na chuva”
Logo que saí da sessão de “Blade Runner” no Cine Marabá, no início de 1983, tive a certeza que tinha assistido uma obra-prima. Depois dessa primeira vez, vi o filme 15 vezes, sem contar em vídeo. No final daquele ano, ele já tinha status de cult, tendo sido eleito um dos melhores de 83 pela enquete do Cinesesc – embora tenha estreado no Brasil em dezembro de 1982 – e estabeleceu o visual dark-gótico que predominaria naquela década (com reflexos no cinema nacional, em filmes como “Cidade Oculta”).
Mas o que tornava “Blade Runner” tão bom? Ridley Scott e os roteiristas David Peoples e Hampton Fancher transformaram a história de Philip K. Dick numa distopia pós-apocalíptica urbana que falava fundo áqueles anos em que o holocausto nuclear parecia inevitável (pouco tempo antes, o telefilme “O dia seguinte”, sobre um ataque nuclear aos EUA, chegara a ser exibido nos cinemas). 2019 parecia tão distante na época, mas os elementos urbanos do filme – megacidades poluídas, com engarrafamentos eternos, habitadas por trombadinhas, punks e hare krishnas – eram familiares ao público de 1982.   Também havia a influencia de "The Long Tomorrow", história em quadrinhos de Dan O’Bannon em parceria com Moebius, que fornecia o clima de um film-noir sci-fi e o desenhista o visual futurista pós-moderno, que inspirou ainda "O Quinto Elemento", e virou um episódio do desenho "Heavy Metal".
"Blade Runner" foi o primeiro filme a ter um "Director's Cut" lançado nos cinemas (depois virou "carne de vaca"). Em 1989, um funcionário da Warner Bros encontrou nos arquivos uma cópia da obra em 70 mm e, alguns meses depois, esses rolos foram exibido num festival de filmes clássicos especificamente na banda de 70 mm. Para a surpresa de todos, era uma versão diferente da conhecida, e logo gerou uma enorme curiosidade entre os cinéfilos, que achavam ter encontrado a "versão do diretor" (que sempre reclamou da narração em off - que Harrison Ford foi obrigado a fazer a contragosto meses depois do fim das filmagens - e da seqüência final feita a partir de cenas não aproveitadas de "O Iluminado", ambas impostas pelo estúdio após as reações negativas do público nas prévias). Ridley Scott foi ver e disse que não era a sua versão, entretanto a onda sobre a cópia foi tanta que convenceu a Warner a relançar o filme em 92 – 10º aniversário da versão original - com a edição do diretor.
A “versão final” de Scott, de 2007, não difere muito da de 92, embora a atriz Joanna Cassidy tenha sido convocada para refazer sua cena de morte – que acabou saindo mal-feita na primeira versão - , se fixando mais no aperfeiçoamento dos efeitos visuais e em consertar certas incoerências do roteiro. Mas os questionamentos sobre a condição humana, sobre a busca por Deus, a degradação do meio-ambiente e até dos seres humanos por conta da poluição, clonagem de seres vivos e a inviabilidae cada vez maior das grandes metrópoles mantém o filme interessante mesmo passados um quarto de século. “Blade Runner” – junto com “Mad Max 2” – ajudou a definir o visual da década de 80, com a poluição visual dos grandes outdoors animados, fotografia escura, visual cyberpunk, as ombreiras da Rachel e - o que foi mais evidente na época – a música de Vangelis. O “Tema de Blade Runner” originou a praga do “saxofone de motel” por toda a década de 80, culminando, é claro, no chatíssimo Kenny G. Mas foram as versões apócrifas e semi-oficiais que fizeram sucesso, porque o músico grego se recusou a gravar ele mesmo uma trilha oficial até 1994, com Dick Morrissey tocando o sax na famigerada faixa.
Num futuro próximo – para nós – a Humanidade degradou tanto o planeta que partiu em busca de novos mundos para habitar. Paralelamente desenvolveu andróides biomecânicos para fazer o trabalho pesado, lutar por e satisfazer sexualmente seus senhores. A última geração desses robôs - os Nexus 6 - é tão parecida aos humanos que apenas um teste emocional chamado Voight-Kampf é capaz de identificá-los, além do fato de só viverem quatro anos. Quando eles se rebelam, são proscritos da Terra e, se apanhados, são sumariamente executados. Os policiais encarregados e perseguir e eliminar os replicantes ilegais são chamados de blade runners.
Muito desse futuro ainda é distante de nós – colonização de outros planetas, viagens espaciais que permitam isso, carros voadores – mas vários aspectos nos são familiares – a degradação ambiental do planeta, megalópoles inabitáveis, clonagem de animais e “asiatização” do mundo. Outra coisa que causou impacto na época eram os detalhes contemporâneos, como a presença de punks, hare-krishnas e publicidades de diversas marcas na época famosas (curiosamente, muitas acabaram, como a Atari e a Pan-Am).
Outros detalhes muitas vezes despercebidos são bastante reveladores. Há os famosos reflexos avermelhados nos olhos dos replicantes, o que inclui nos de Deckard-Harrison Ford numa cena deste Final Cut, em que o diretor impõe de vez sua versão de que o protagonista é um andróide. Além disso, enquanto todos os replicantes são altos, fortes e bonitos (à exceção de Léo), os humanos do filme são feios e deformados, o que não é o caso de Ford. O sonho do unicórnio – introduzida ou recuperada na versão de 1992 – já era um indício de que Deckard era um replicante e que Gaff (Edward James-Olmos) sabia.
A escalação do elenco é um caso à parte, especialmente a do protagonista Deckard, mais um exemplo da sorte de Herrison Ford em ganhar grandes papéis de presente. O personagem tinha sido pensado por Scott para seu amigo Michael Douglas, mas quando este conseguiu grana para seu projeto “Tudo por uma Esmeralda” desistiu de Deckart. A princípio, parecia que o filho de Kirk tinha se dado bem, já que a cópia descarada de “Caçadores da Arca Perdida” foi um sucesso de bilheteria e “Blade Runner” não. No entanto, hoje em dia ninguém mais tem vontade de ver as peripécias dele, Kathleen Turner e Danny de Vito numa América do Sul de araque, enquanto o sci-fi estrelado por Ford é relançado no mínimo uma vez por década. O próprio Harrison Ford achou que tinha embarcado numa furada, pois já era uma estrela importante, com dois Star Wars e “Os Caçadores da Arca Perdida” no currículo. Passou todo o tempo brigando com o diretor e ficou furioso quando foi convocado para fazer a narração em off meses depois do fim das filmagens. Toda essa zanga e frustração é passada na sua atuação, que acabou ficando perfeita no contexto da obra. Sua opinião sobre o trabalho foi mudando à medida que o filme foi virando cult.. Quem não se cansa de elogiar “Blade Runner” é Rutger Hauer: afinal é o filme que lhe abriu as portas em Hollywood e definiu a persona cinematográfica que assumiria a partir daí. Era o favorito de Anne Rice para ser seu vampiro Lestat no cinema, e a versão para a telona de 94 teria sido outro com ele no lugar de Tom Cruise. Não consigo nem imaginar quantas vezes os nerds nas convenções de sci-fi devem ter pedido para ele recitar sua fala final: " I've seen things you people wouldn't believe. Attack ships on fire off the shoulder of Orion. I watched C-beams glitter in the dark near the Tannhauser gate. All those moments will be lost in time... like tears in rain... Time to die." 

***
Das moças, quem se deu melhor foi Daryl Hannah, que se tornou uma estrela importante e namorou John-John Kennedy. Já decadente em 2004, Quentin Tarantino a fez repetir a morte de Pris em “Kill Bill parte 2”. A Rachel que Scott criou sobre a bela Sean Young é uma das imagens mais fortes do filme, mas a carreira da atriz não decolou. Quase foi a Mulher-Gato de “Batman – O Retorno”, mas ao ser preterida por Michelle Pfeiffer, foi ao set vestida como a personagem para confrontar o diretor Tim Burton. Afinal, ela já havia perdido o papel de Kim Basinger no primeiro “Batman” porque havia se ferido numa queda de cavalo. Joanna Cassidy já não era uma novata, tinha estreado no ano de 1968 numa ponta em “Bullitt”, e foi a única a participar fisicamente da edição final de 2007, para refazer a cena de morte de Zhora, e ficou feliz ao constatar que ainda cabia no figurino de 30 anos atrás.


***


Em 2009, o site  Total Sci-Fi Online elegeu “Blade Runner” como o melhor filme d ficção-científica de todos os tempos. A escolha aconteceu porque o longa teria um "senso real de tristeza, medo e anseios, e um amargo senso de humor". Além disso, eles também destacam as interpretações de Harrison Ford, como "um herói muito mais sombrio do que Han Solo" e de Rutger Hauer, no que é chamada de "a melhor performance de sua carreira". Resumindo, o filme é considerado uma obra-prima.
Blade Runner superou produções que fizeram muito mais sucesso na época de seus lançamentos, como Star Wars e ET. Veja abaixo a lista com os dez primeiros colocados:


1 – Blade Runner (1982)
2 – 2001: Uma Odisséia no Espaço (1968)
3 – Star Wars (1977)
4 – Alien (1979)
5 – Metropolis (1927)
6 – O Dia em que a Terra Parou (1961)
7 – O Exterminador do Futuro (1984)
8 – Planeta dos Macacos (1968)
9 – E.T. (1982)
10 – Solaris (1972)

Algumas curiosidades da lista:
·                     Ridley Scott emplacou dois filmes na lista do top 10, Blade Runner ( 1º) e Alien (4º);
·                     Toda a primeira trilogia Star Wars está entre os 100, o original ( 3º), O Império contra-ataca ( 13º) e O Retorno do Jedi ( 35º). Nenhum da segunda trilogia entrou no ranking.
·                     James Cameron tem quatro filmes na lista, O Exterminador do Futuro 1 (7º) e 2 (32º), Aliens ( 15º) e O Segredo do Abismo (42º). Steven Spielberg também tem quatro, ET ( 9º), Encontros Imediatos de Terceiro Grau ( 11º), Jurassic Park (25º) e Minority Report ( 57º). George Lucas, que não se considera um diretor, tem o mesmo número de filmes arrolados: os três Star Wars originais e THX 1138( 92º). Paul Verhoeven tem três trabalhos rankeados, O Vingador do Futuro (20º), Robocop ( 24º) e Tropas Estelares ( 76º). Stanley Kubrick tem dois, 2001(2º) e Laranja Mecânica ( 27º), assim como Andrei Tarkovsky com Solaris (10º) e Stalker ( 50º). George Miller pos os dois primeiros Mad Max na lista, o II em 34º (Uma injustiça, merecia colocação melhor) e o I em 70º. Também com dois trabalhos entre os 100 estão Terry Gilliam, com Brazil ( 17º) e Os 12 Macacos (83º); John Carpenter, com O Enigma do Outro Mundo ( 23º) e Fuga de Nova York ( 52º); e David Cronenberg com A Mosca ( 31º) e Videodrome ( 62º, outra injustiça);
·                     Dois filmes da série original Star Trek estão entre os 100, o clássico A Vinçança de Khan ( 19º) e A Terra Desconhecida ( 67º, pra mim, faltou A Volta para Casa), mas também a reinvenção da franquia por J.J. Abrahams, Star Trek ( 93º).
·                     Os atores que mais aparecem na lista são Harrison Ford com Blade Runner e os três Star Wars; Arnold Schwartzenegger, nos dois primeiros Exterminadores mais O Vingador do Futuro; Charlton Heston com O Planeta dos Macacos ( 8º), A Última Esperança da Terra ( 49º) e No ano de 2020 ( 72º) - sendos os tres bastante apocalipticos.
·                     Apenas Wall-E ( 37º), Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças ( 45º),Minority Report, A Fonte da Vida ( 60º), Filhos da Esperança ( 66º), Donnie Darko ( 71º), Moon ( 74º), O Homem Duplo ( 77º), Serenity ( 88º), Primer (90º, inédito aqui) e Star Trek são deste século.