Obra de José Paulo Ifanger vai parar no lixão
Prefeitura diz que consultou Pró-Memória mas presidente diz
que não sabia
Marcos Kimura
Restos do monumento jogados no lixão |
O obelisco da rotatória da Avenida Conceição, em frente ao Instituto
de Reabilitação e Prevenção em Saúde Indaiá (IRPSI), o popular Telhadão, desapareceu
de um dia para o outro. Obra do artista plástico José Paulo Ifanger, falecido
no final de 2011, a obra foi inaugurada nos anos 80 para marcar a inauguração
da Avenida Conceição. “Para o Zé Paulo, ela representava o progresso que a
cidade vivia então, que era representada pela abertura daquela avenida
perimetral, quase um mini-rodoanel da cidade”, explica o ex-prefeito José
Carlos Tonin, que encomendou o obelisco. “Quando minha mulher contou que iam
por a obra abaixo, achei que era brincadeira. E agora, esta semana, derrubaram
mesmo”, conta.
A arquiteta Ana Paula Ifanger Sinisgalli, filha de José
Paulo, diz que ganhou um triste presente de aniversário, que foi na última
terça-feira. Em sua página na rede social Facebook, ela manifestou sua
indignação com a “falta de respeito à arte e à cultura da nossa cidade”,
recebendo a solidariedade de diversos amigos. Ela disse à Tribuna que a família
está desolada com o descaso. “Imagine se meu pai estivesse vivo. Quando
pintaram o obelisco de uma cor feia ele foi lá, levou uma foto pra usarem um cor
melhor. Agora botaram tudo abaixo!”, diz.
Em nota oficial, o
secretário de Obras, José Carlos Selone, “informou que a retirada do
monumento foi necessária para a implantação do projeto de trânsito na
confluência das avenidas Conceição e Bernardino Bonavita. Ele ressalta que a
obra tem como objetivo melhorar a fluidez do trânsito no local e,
consequentemente, tornar o trecho mais seguro para condutores de veículos
e pedestres, considerando que acidentes graves já foram registrados
naquele ponto da cidade.”
A reportagem perguntou, por meio da
Assessoria de Comunicação da Prefeitura, se não foi levada em consideração que se
tratava de uma obra de arte ou se cogitou sua transferencia para outro local. A
resposta foi que A
Prefeitura solicitou uma avaliação por parte da Fundação Pró-Memória, que concluiu
que a remoção e transporte do monumento da rotatória da Av. Conceição para
outro local na cidade despenderia de alto custo, por isso não foi feito. Procurado
pela Tribuna, o presidente da Fundação Pró-Memória, Antonio Reginaldo Geiss,
disse que não sabia da remoção do obelisco nem que ele era de autoria de José
Paulo Ifanger.
A
Tribuna perguntou ainda à Prefeitura se uma outra obra de José Paulo Ifanger,
que fica na rotatória das Avenidas Conceição, Presidente Kennedy e Engenheiro
Fábio Barnabé, também poderia desaparecer com a reforma que será feita lá, e a
resposta foi que o projeto ainda não está pronto e, segundo o secretário de
Obras, o objetivo inicial é não mexer nos monumentos, mas, em alguns casos, a
mudança se faz necessária para melhorar a segurança no trânsito.
Inconformado
O
conselheiro e fundador da Fundação Pró-Memória de Indaiatuba, Antonio da Cunha
Penna, diz que não se conforma com a falta de respeito da Prefeitura em relação
à entidade, que só é reconhecida em relação à guarda de fotografias velhas e do
Arquivo Público. Mas nas demais atribuições relativas à Memória, não somos
consultados para nada.“Por exemplo, a fachada do centenário Cemitério Velho foi
mudado sem nenhuma consulta”, lembra.
“Na
terça-feira, durante a reunião do Conselho Deliberativo, coincidentemente manifestei
meu descontentamento com essa falta de respeito e no dia seguinte tive essa
confirmação, quando fiquei sabendo que o monumento, que é um bem público, obra
de um artista indaiatubano importante, foi destruído. Outros monumentos do
artista José Paulo Ifanger, bem como o nosso pontilhão Fepasa são bens públicos
sujeitos a terem o mesmo destino. Como se não bastasse a falta de instrumentos
legais para se preservar bens particulares, dos quais restam bem poucos, como a
casa do Major Alfredo da Fonseca, que até recentemente estava preservada e foi
descaracterizada por uma reforma. (Publicado em 3 de setembro de 2011)
A César o que é de César e ao povo o que é do povo
O obelisco original |
Não pretendia retornar ao assunto, mas já que o prefeito
Reinaldo Nogueira resolveu consertar o erro, retomamos o assunto. Para quem não
sabe, em entrevista na quarta-feira à Rádio Jornal – em cujos estúdios ele se
sente cada vez mais “em casa” – nosso alcaide reconheceu que houve um erro e
que vai reconstruir o obelisco da rotatória do Telhadão em local próximo. A
informação foi confirmada pela Assessoria de Comunicação Social da Prefeitura. Lógico
que ele não citou a Tribuna de Indaiá em sua fala, mas é inegável que o barulho
provocado pelo jornal acendeu o debate que pegou fogo pela Internet,
principalmente no Facebook, onde surgiu uma nova comunidade, Indaiatuba Ativa, criado
na segunda-feira e que até quinta-feira já tinha 278 membros.
À exemplo do Doutor Hélio, quando quis desqualificar a
votação do seu impeachemnt, o prefeito Reinaldo Nogueira disse que a
movimentação em torno do assunto era “política”. Ora, mas certamente que é.
Tudo o que se refere à vida da cidade é política, ou “arte ou ciência da
organização, direção e administração de nações ou Estados; aplicação desta arte
aos negócios internos da nação (política interna) ou aos negócios externos
(política externa). Nos regimes democráticos,
a ciência política é a atividade dos cidadãos que se ocupam dos assuntos
públicos com seu voto ou com sua militância.”
Então, quando cidadãos protestam e debates assuntos
relativos é cidade é sempre política, independente de partidos. O fenômeno
Internet permite que as mobilizações aconteçam em tempo muito curto e que os
assuntos repercutam em tempo real. Mas ainda assim, um “empurrãozinho” das
mídias tradicionais são necessárias, como se ve nesse caso e no impeachment do
Doutor Hélio.
O prefeito de Campinas caiu nem tanto por conta da
mobilização de seus opositores, mas pela indignação dos cidadãos diante da
gravidade das denúncias do Ministétrio Público, suficientes para que a Justiça
decretasse prisão temporária de vários denunciados, inclusive o vice-prefeito
Demétrio Vilagra, atualmente (na época) no comando do Executivo. Tudo com uma
cobertura histórica dos meios de comunicação, principalmente da EPTV, que mudou
a habitual pauta “água com açucar” de seu telejornal vespertino para bombardear
o espectador diariamente com repercussão do caso ou com novas denúncias. Mesmo
que nada ligasse diretamente o nome de Hélio de Oliveira Santos aos escândalo
da Sanasa, o envolvimento de sua esposa, tida como chefe da quadrilha, provocou
o seu impeachment. “Não basta à mulher de César ser honesta, ela tem que
parecer honesta.”
Em Indaiatuba, a destruição do obelisco é um elemento a mais
dentro diversos outros assuntos, como o muro milionário da Câmara erguido por
empresas fantasmas e a desapropriação pelo Município de terreno do próprio
prefeito – tudo denunciado e apurado pela imprensa – , e que vem causando uma
crescente indignação pública manifestada na Internet. A reconstrução do
monumento é, certamente, uma vitória da mobilização pública apartidária em
conjunto com a mídia. Mas ela não deve ficar restrita a isso. A luta para
contruir a cidade que sonhamos, mais humana, mais segura, com maior
transparencia, passa pela informação, discussão e ação.
PS: fora o custo da reconstrução que vai recair sobre os
impostos que todos pagamos, não vejo nada de errada na reconstrução, já que se
trata de um projeto do artista José Paulo Ifanger e não uma escultura. Da mesma
forma, a manutenção do muro de taipa do Pau Preto, que na verdade ruiu há
muitos anos atrás, também é importante pela questão simbólica. No Japão, o
Templo de Ise, erguido em madeira há 1500 anos e que é reconstruído a cada 20
anos seguindo o projeto e método originais. Então, a mais antiga estrutura
civil da cidade merece ser também ser preservada pelo mesmo método, como
testemunha de nossas origens.(Publicado em 17 de setembro de 2011)
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