quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Os “ensinamentos” de Steve Jobs


Se em vida, Steve Jobs foi uma lenda da inovação tecnológica, após a morte virou uma espécie de divindade da área da administração e gestão. Basta ir a qualquer livraria que podem ser encontrados incontáveis volumes que usam seu nome em vão, mas não se engane: o único indispensável é a biografia – quase oficial – de Walter Issacson, que saiu logo após a morte do CEO da Apple. É quase oficial porque, embora encomendada pelo próprio Jobs (que com seu aval permitiu ao escritor acesso a pessoas que dificilmente concederiam entrevista), o biografado não aprovou nem leu o resultado final, para que o livro fosse o mais isento possível. Isso é extraordinário para alguém sabidamente controlador, mas pode ser compreendido quando conhecemos o drama vivido por ele a partir do diagnóstico de câncer.
Para quem se sentir atraído por algumas das opções de leitura mais baratas, um alerta: não existe lição em administração a ser aprendida com Steve Jobs, a não ser negativa. Seu sucesso é resultado de inteligência e personalidade únicas, dentro de um contexto histórico específico.
Antes dos 30 anos, Steve Jobs já era uma lenda do Vale do Silício, graças à revolução do Apple II, que praticamente criou o mercado de computadores pessoais, algo restrito a nerds (geeks) mas que hoje é um eletrodoméstico tão difundido quanto a máquina de lavar roupas. O Macintosh inovou com a interface gráfica e o mouse, conceitos vencedores, mas foi superado pela Microsoft em marketing e devido a diversas falhas do projeto, como a falta de memória, que obrigava o usuário a gravar seus trabalhos em disquetes. Fora da empresa, comprou a divisão de animação digital da Lucas Film para transformá-la na Pixar. Em seu segundo turno como CEO da Apple, primeiro salvou a empresa da falência lançando o Power Mac e iMac, e depois revolucionou a indústria da música com o i-Pod, depois a telefonia móvel com o i-Phone, e finalmente lançar o que pode ser a pá de cal na mídia impressa com o i-Pad (Isso merece um post à parte).
A espetacular saída de Jobs da empresa que criou junto com o amigo e geek supremo Steve Wozniak, pelas mãos de John Sculley, o executivo que lutou para tirar da Pepsi para comandar a Apple (“Você quer passar o resto da vida vendendo água adocicada ou quer uma chance de mudar o mundo?”, foi o lendário desafio lançado por Jobs a Sculley) é contada em todas as etapas e com depoimentos dos principais envolvidos.  Issacson, embora fã do seu biografado, não esconde seu péssimo gênio (destratava subordinados constantemente), sua falta de consideração com as pessoas (demorou anos para reconhecer sua primeira filha) e mesmo sua falta de escrúpulos (conspirava constantemente contra colegas). O que não o coloca em pé de igualdade entre os capitalistas inovadores.
Thomas Alva Edison foi um gênio inquestionável no ramo das invenções, mas foi um empresário ganancioso e inescrupuloso. Ao perder para Nicola Tesla na questão corrente contínua (Edison) x corrente alternada (Tesla), passou a perseguir o adversário até levá-lo à ruína. Hollywood surgiu graças a Edison por que ele detinha a patente do kinetoscópio, que embora muito diferente do cinematógafo dos Lumière, lhe permitia cobrar royalties da indústria começava a engatinhar nos EUA. Por isso, os primeiros produtores resolveram fugir para a ensolarada Califórnia, onde, além de não ter de pagar para Edison, podiam filmar o ano todo. Henry Ford, o inventor da linha de produção que tornou o automóvel um produto popular, além de ser implacável com grevistas (mandava seus seguranças particulares mandar bala nos piquetes, sob olhar complacente das autoridades constituídas) era anti-semita militante, que nutria simpatia por Adolf Hitler. Ambos deixaram empresas que sobrevivem até hoje, a General Eletric e a Ford Motors. Essa era uma das ambições de Steve Jobs; deixar um legado, uma companhia que sobrevivesse a ele, não importando os corpos que fossem deixados pelo caminho.   

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