segunda-feira, 1 de abril de 2013

Considerações sobre Amor e o Som ao Redor

Vi só agora dois dos mais festejados e importantes filmes do ano passado,   "Amor", de Michael Hanecke, candidato ao Oscar de Melhor Filme mas vencedor da categoria Filme em Língua Não-Inglesa, e "O Som ao Redor", de Kleber Mendonça Filho, Premio Itamatary da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Como eu suspeitava, "Amor" é o melhor da lista de indicados ao grande premio da Academia, mas Não ganharia nem em um milhão de anos. Essa contradição em termos pode ser explicada em parte pelo fato do Oscar ser um premio da indústria do cinema americano, e um não de arte como a maioria supõe. Mas então por que inclui-lo na lista e preterir o muito mais palatável "Os Intocáveis", que ficou fora da disputa de filme estrangeiro, provavelmente por ser falado no mesmo francês ("Amor" representou a Áustria, apesar de atores e idioma serem da terra de Gèrard Depardieu)? Porque é para isso que a categoria de lingua não-inglesa serve: premiar o Grande Cinema. A indicação a Filme e Diretor foi mais como uma condecoração da parte de Hollywood, reconhecendo a excelência do trabalho de Hanecke, um dos mais eminentes realizadores europeus da atualidade. Mas, repito, sem a intenção de conceder-lhe esses premios principais.
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Voltando a "Amor" propriamente dito, a escalação de Emanuelle Riva e Jean-Louis Trintignant para os papéis principais deu um toque a mais de crueldade à situação dos personagens, pois todo cinéflo que se preza se lembra do principal papel cinematográfico dela anteriormente, "Hiroshima Mon Amour", em que ela protagonizava uma das mais emblemáticas cenas de amor da história do cinema, e ele como galã de clássicos como "E Deus criou a Mulher" e "Um homem e uma mulher". Essa lembrança acrescenta uma dose de tragédia maior para quem se recorda do casal em plena forma. Embora seja o mais "leve" dos trabalhos de Hanecke, o filme não faz concessões ao horror de um parceiro assistir impotente a agonia e decadência física do outro. Ao mesmo tempo, o "Amor" está presente em todos os momentos entre os personagens de Trintignant e Riva, até mesmo nas cenas mais tensas, incluindo o ato derradeiro.
"O Som ao Redor" também não faz concessões. Trata de uma Recife contemporânea ainda presa aos tempos de "Casa Grande & Senzala". Enquanto o latifúndio rural está decadente a propriedade urbana do senhor de engenho floresce na forma de condomínios com nomes afrancesados (Edifício Camile Claudel é ótimo). Realizado por um crítico de cinema, o filme é cheio de referências, mas não se desvia de seus temas principais por causa deles, ao contrário, os utiliza para sublinhá-los. A especifidade histórica e geográfica se mescla com a universalidade da vida nas cidades grandes atuais, em eterna tensão entre quem tem e quem não tem, a claustrofobia dos condomínios classe média e o crescente reacionarismo desta. A sequencia da reunião de condomínio resume bem tudo isso, mas não poupa o rapaz bem-nascido de boas intenções que defende o velho porteiro em vias e ir para a rua sem receber nada, mas que cai fora da votação diante da perspectiva de uma boa transa.
"Amor" foi exibido durante duas semanas no Multiplex Topazio e "O Som ao Redor" foi o primeiro nacional a ser exibido este ano pelo Cineclube Indaiatuba, programado pelo fotógrafo, compositor, escritor laureado e best-seller local Antonio da Cunha Penna; e este blogueiro.


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