terça-feira, 1 de setembro de 2009

A Grande Guerra

polonia

Hoje o mundo recorda os 70 anos do início da Segunda Guerra Mundial, o mais importante e devastador conflito armado da história e que até hoje excita a imaginação das pessoas. Basta ver o sucesso do último Tarantino, Bastardos Inglórios, e a quantidade de publicações sobre o tema encontrada nas bancas.

A última Superinteressante, por sinal, tentou explorar o tema com uma chamada bombástica, mas que nada mais é do que matéria requentada. Que alguns judeus preferiram lutar a ir passivamente ao matadouro e que o Exército Vermelho é quem foi responsável ela derrota de Hitler qualquer pessoa razoavelmente esclarecida sabia. O texto chega a cometer uma injustiça ao subestimar em demasia o Dia D: a quantidade de tropas envolvidas podia ser bem inferior às que lutaram em Stalingrado e Kursk, mas a logística exigida não deixou de ser extraordinária, bem como o planejamento anglo-americano. Ademais, foram as dificuldades inerentes a uma operação anfíbia que, basicamente, impediram os alemães de invadir a Inglaterra em 1940.

Até 1939, a Grande Guerra foi a Primeira, entre 1914-18, que encerrou de verdade o século XIX. Ok, Eric Hobsbawn, o maior historiador vivo, considera que a Revolução Bolchevique é que inaugurou o curto século XX, mas sem a matança iniciada com o assassinato do arquiduque austro-húngaro, dificilmente haveria condições para ela ocorrer, a despeito da decadência do Romanov.

O surgimento da União Soviética, a ascensão dos americanos, o fim dos impérios austríacos e otomano, a eliminação das elites britânica e francesa e a humilhação dos alemães e italianos (vencedores no papel mas ignorados no Tratado de Versalhes) teriam conseqüências inimagináveis em 1918. Tanto é que a Segunda Guerra é vista por muitos como a Última Batalha da Primeira. Mas a imaginação deste século XXI tem muito mais a ver com a última Grande Guerra.

Os motivos para isso são muitos e vão desde a quantidade de filmes e livros sobre ela até o fato de grande parte do planeta ainda viver ressentimentos vindos desse conflito. Nem em seus tempos de potência econômica exemplar o Japão pode assumir a liderança da Ásia, muito em função dos crimes cometidos por suas forças armadas a partir de 1937 (ano do chamado Estupro de Xangai). Os poloneses, libertos da opressão soviética, vão relembrar a invasão nazista sem esquecer o ataque traiçoeiro de Stalin, além de atacar o país quando este estava ocupado com a Blitzkrieg no Ocidente, ainda mandou eliminar a elite dos oficiais da Polônia nas florestas de Katyn. Wladimir Putin já fez um discurso alegando que a então URSS não tinha outra saída a não ser firmar o tratado de não-agressão com Hitler, depois do acordo formado em Munique em 1938 entre Alemanha, Reino Unido e França.

churchill

Esse é outro passatempo fascinante envolvendo a II Guerra Mundial: o que teria acontecido se... A primeira encruzilhada histórica foi justamente a crise de 1938, quando Hitler exigiu um pedaço da Tchecoslováquia e as potencias ocidentais européias caíram no blefe e cederam. Quase todos os historiadores consideram que, se a guerra tivesse começado ali e não um ano depois, a Alemanha teria desistido ou o conflito teria sido mais curto e as ambições do Fuhrer contidas. O momento crucial seguinte é dois anos depois, quando a França está desmoronando e a Inglaterra fica sozinha contra o Eixo. Se no primeiro round, quem jogava pelo Império Britânico era o cortês e cavalheiro Neville Chamberlain, um bom político de tempos de paz mas um péssimo jogador de pôquer, no segundo assalto o player era Winston Churchill, o homem certo na hora certa. O historiador John Lukacs, considera que os 80 dias em que a Inglaterra enfrentou a Alemanha sozinha salvaram o mundo. E foi Churchill praticamente sozinho que segurou a onda. O destino da guerra mudou quando Hitler decidiu voltar suas atenções para a URSS e, meses mais tarde, o Japão atacou os EUA. Mas a sorte da Europa estaria selada caso o Império Britânico tivesse se rendido ou mesmo feito um acordo com Hitler (e não faltaram ofertas da parte deste).

A terceira encruzilhada é: o que aconteceria se os japoneses tivessem afundado os porta-aviões americanos em Pearl Harbor? A capacidade industrial dos EUA poderia repor essas belonaves a tempo da virada em Midway? Talvez não fosse o suficiente para o Japão ganhar a guerra no Pacífico, já que o grande objetivo do império estava na China, mas talvez a coisa se esticasse por mais tempo.

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A quarta bifurcação é a mais fascinante e assustadora: o que aconteceria se a Alemanha desenvolvesse a bomba atômica primeiro? Muita gente já explorou essa hipótese, do clássico episódio de Jornada nas Estrelas, A Cidade à Beira da Eternidade, a o filme Fatherland, passando por uma obscura história na fase final da série de quadrinhos Brick Bradford. O fato é que dificilmente Hitler conseguiria ter uma arma nuclear viável antes dos americanos sem as mentes envolvidas no Projeto Manhattan, muitas delas fugitivas do Holocausto, bem como os imensos recursos que Roosevelt destinou ao desenvolvimento do artefato.

***

 

É triste constatar que o desenvolvimento tecnológico está diretamente ligado às guerras neste século. Se a I Guerra Mundial criou o avião e o tanque como armas, a Segunda foi mais longe. Os aeroplanos começaram o conflito a hélice e terminaram a jato, o computador foi inventado para calcular trajetórias balísticas dos canhões e, em 1945, a história da Humanidade entrou na Era Atômica. E se levarmos a sério o romance Contato, de Carl Sagan, as primeiras imagens que supostos seres de outros planetas terão da Terra podem em ser as da ascensão do nazismo, que foi uma das primeiras transmissões de TV em larga escala, cujas ondas se propagaram pelo espaço exterior….

Hiroshima

Um comentário:

Eliana Belo disse...

Não existe a condicional "se..." na História. Mas mesmo assim, esse texto é um interessante exercício de filosofia.
Outro [ ],

Eliana