terça-feira, 22 de setembro de 2009

Freud vive


De vez em quando eu via um programa americano em que alguém dizia "a psicanálise está superada" ou "Freud foi desmentido". Mas como? Já faz tempo que deixei de conviver com o meio, mas nos meus tempos de Instituto de Psicologia da USP, além de ser cosiderado o melhor psicólogo de boteco da turma, era também o freudiano mais ortodoxo, "mais do que caixa de maisena", nas palavras do Analista de Bagé. Renato Mezan, em seu livrinho sobre Freud na coleção Encanto Radical, da Brasiliense, dizia que o fundador da Psicanálise havia feito a "aventura mais solitária e mais arriscada jamais empreendida por um ser humano: a descoberta do seu próprio inconsciente e a formulação das leis que regem não apenas este inconsciente individual, mas também o de todos nós". Mais de 100 anos depois da publicação da Interpretação dos Sonhos, a fantástica descoberta do neurologista vienense está em descrédito?

Domingo, o Caderno 2 de Estadão, foi quase todo dedicado a Sigmund Freud e responde a alguns desses questionamentos, especialmente a entrevista com a psicanalista e intelectual francesa Elisabeth Roudinesco. A efeméride que justifica as seis páginas do suplemento cultural de um dos principais jornais do País são os 70 anos da morte de Freud, que serão completados amanhã, 23 de setembro.
Ele morreu quando se iniciava a maior comprovação de uma de suas teorias mais contestadas, que era a instinto de morte, a pulsão destrutiva que todo ser humano carrega dentro de si e que tinha que ser contida por leis, repressão, o chamado superego. A Segunda Guerra Mundial e sua escalada de matança mostra o ponto que esse impulso destrutivo pode atingir. Até então, todos achavam que o máximo de mortandade que se poderia chegar era o conflito 1914-18, mas Freud, que perdeu um filho nas trincheiras, já apontava para as possibilidades nefastas do nazismo, que o levou a deixar sua Viena por Londres, onde faleceu.

Roudinesco aponta para os motivos pelos quais a psicanálise andou em baixa nos últimos tempos. Em primeiro lugar, ela critica o cientificismo, que "biologizou" a psiquiatria, e o isolacionismo dos psicanalistas, que se fecharam em si mesmos e seus dogmas, se omitindo diante dos problemas da sociedade em geral. Para a intelectual, a psiquiatria "era uma medicina da alma. Mas a deslocaram para a biologia. Curamos a loucura? Não. Acalmamos os loucos? Sim. Vivemos um recuo de 50 anos com a psiquiatria 'biologizada'."
Em relação à tribalização da Psicanálise, Roudinesco, marxista, fica intrigada com o fato da maioria dos psicanalistas serem conservadores. Para ela, é que eles se desinteressaram dos problemas sociais e, assim, tornaram-se conservadores. A sociedade e a civilização eram temas explorados por Freud em textos durante muito tempo subestimados, mas que depois foram reavaliados. Quando antropólogos como Malinowski descobriram culturas que não consideravam o incesto tabu, muitos consideraram que aquilo demolia a Psicanálise. Mas a estrutura do tabu é um constante em todas as culturas, então não importa se a proibição é em relação a pais e filhos ou entre tios e sobrinhos, a repressão é fundamental para o que chamamos de civilização. Isso significa também que não se devia ler Totem e Tabu como uma tentativa de antropologia, mas uma psicanálise da Humanidade por meio de seus sonhos, que são os mitos. É a partir daí que Jung vai inventar o inconsciente coletivo, com bases supostamente científicas, que não existem.

Joseph Campbell, pelo seu lado, vai para a análise comparada dos mitos de todas a culturas e por meio desses paralelos, estabelece essas histórias universais fazem parte de um patrimônio comum a toda Humanidade e que nos ajudam a viver e a nos relacionar com os outros.
A psicanalista considera que estamos assistindo um grande retorno de dois grandes pensadores: Freud e Marx. "Não ao comunismo e à psicanálise, mas a Marx e Freud. Autores como Marx, Freud, Nietzsche e toda a filosofia da rebelião se tornaram malditos nos últimos 20, 30 anos, quando caímos em um estado de neoconservadorismo. A crise econômica, em especial como a que se passou nos Estados Unidos, vai desempenhar um papel considerável. Vamos voltar ao pensamento da rebelião", avalia.

Um comentário:

Eliana Belo disse...

(1) Pegue o texto de Freud; (2) Cole no Word; (3) Localize todas as palavras SEXO; (4) Troque-as pela palavra PODER.

Pronto. Freud passa a ser atualíssimo.

Ou não?