terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Collor relembra o Domingo Negro



Na semana passada, o canal Globo News exibiu um programa especial em que Fernando Collor de Mello falou pela primeira vez á imprensa sobre seu governo e os acontecimentos que levaram ao seu impeachment. O ótimo blog de Geneton Moraes Neto, transcreve parte desse depoimento histórico e o coloca à disposição de quem não tem TV a cabo.
Na parte reproduzida abaixo, o primeiro presidente eleito pelo voto direto após a ditadura militar reconhece que, quando conclamou a população a se vestir verde amarelo no domingo seguinte para apoiá-lo e, ao invés disso, todo mundo saiu de preto, ele percebeu que tinha perdido a presidencia. Foi o chamado Domingo Negro, episódio estranhamento subestimado na cronologia histórica posterior à crise, uma manifestação espontânea, que não foi organizada por nenhuma organização ou partido. As pessoas simplesmente sairam de casa vestidas de preto, algumas em passeata outras para eventos comuns. Lembro que naquela noite fui jurado de algum concurso de beleza no Clube 9 de Julho e vi que a garotada estava vestida de preto. Ali eu, que tinha participado da campanha das Diretas-Já, percebi que aquela confusão ia dar em alguma coisa. Um momento histórico importante.


O DIA EM QUE AOS BRASILEIROS NÃO ATENDERAM AO PEDIDO DO PRESIDENTE E NÃO FORAM ÀS RUAS VESTINDO VERDE E AMARELO: “PERCEBI QUE HAVIA PERDIDO A PRESIDÊNCIA”

GMN: Quando enfrentava uma onda de denúncias, o senhor fez um discurso veemente em que pediu à população que se vestisse de verde e amarelo.Mas os manifestantes se vestiram de preto.Ali,o senhor sentiu que perdeu a capacidade de mobilizar apoio?

COLLOR: “Sem dúvida.Aquele foi o momento em que percebi que eu havia perdido a Presidência.Era uma solenidade bonita, um momento em que eu estava assinando atos que beneficiavam os taxistas. Havia muitos taxistas na ala oeste do Palácio do Planalto, exatamente aquela que fica mais próxima do Congresso.Estava apinhada de gente.O presidente do Banco do Brasil,o da Caixa, o ministro da Economia, muitos com uma fita verde e amarela na mão. Eu disse ao locutor que conduzia os trabalhos: “Eu não falarei.Falam os que estavam programados,como o representante do grupo de taxistas, o presidente da Caixa. Encerrada a solenidade, me dirigi para o elevador, quando então o pessoal começou a gritar; “Fala, Collor!Fala!Fala!”. Veio,então, o presidente da Caixa Econômica: “Presidente, não deixe de falar para este pessoal….Todos querem ouvir uma palavra sua”. Voltei. “Que saiam no próximo domingo de casa, com alguma peça de roupa numa das cores da nossa bandeira. Que exponham nas suas janelas toalhas, panos, o que tiver nas cores da nossa bandeira, porque assim,no próximo domingo, estaremos mostrando onde está a verdadeira maioria”.

GMN:O senhor se arrepende de ter feito aquela convocação ?

COLLOR: “Eu me arrependo. Aquilo foi uma atitude temerária. É o que se chama de cutucar a onça com a vara curta.Ali,talvez por eu estar sob uma pressão muito grande,eu quisesse,no fundo, saber logo qual seria o desfecho de tudo aquilo. Porque foi um processo de tortura. Então, eu disse: “Com isso, ou a gente vai se afirmar nas ruas ou então se a gente se sentir abandonado nesse processo, eu já sei que não tenho mais forças para pode lutar. E ai, quando no domingo as informações começaram a chegar de que as pessoas estavam se vestindo de preto ao invés de verde e amarelo, eu disse: “A Presidente está perdida”. Dentro de mim, caiu exatamente esta compreensão de que,ali, o jogo estava perdido”.

GMN:A idéia de convocar a população para que todos fossem às ruas de verde e amarelo partiu inteiramente do senhor? Nenhum assessor sugeriu?

COLLOR:“Aquilo foi de inopinado,naquele momento,naquele instante”.

GMN:O senhor diria que este foi o grande erro político na condução daquele processo, naquele momento ?

COLLOR:“Sem dúvida, sem dúvida. Isso foi um erro tático seriíssimo”.

GMN:O senhor tinha a ilusão de que contaria com o apoio popular naquele momento?

COLLOR:“Tinha”

GMN:O que é que levava o senhor a acreditar ?

COLLOR:“O que me levava a acreditar era que a vinculação minha com o povo era muito forte.Mas, naquele momento, se ele não estava contra mim, impregnado pela torrente que o noticiário fazia desaguar pelas manhãs, tardes e noites, eu imaginava que pelo menos o povo estivesse neutro,na dúvida.”Eu estou em dúvida”. E, estando em dúvida,não tomaria uma posição”.

Um comentário:

Cynthia Santos disse...

Não foi um erro tático. Foi arrogância. Mais ou menos como no caso do nosso prefeito, que tinha certeza que se elegeria com 78% dos votos nas eleições de 2008. Será que se sofresse um impeachment também convocaria a população a se vestir de verde e amarelo?