Esta semana estréia o mais novo filme de James Bond, Quantum of Solace, o segundo com Daniel Craig no papel do agente secreto mais famoso do mundo (uma contradição em termos). Desde que comecei a ir ao cinema sozinho que assisto a todos os filmes de 007 e reconheço que é uma perversão para um cinéfilo. Para a maioria dos críticos, a série toda copia as inovações criadas por Alfred Hitchocock em "Intriga Internacional" (que ainda pode ser encontrado nas bancas na coleção Videoteca Veja). O primeiro filme da série, "O Satânico Dr. No" (1962), foi beneficiado pela Crise dos Mísseis de Cuba, momento em que a Guerra Fria chegou mais perto de esquentar de vez, mas ao invés de usar como vilã a agência soviética Smersh - criada nos livros de Fleming - preferiram substituí-la pela Spectre, uma organização privada que pretendia dominar o mundo. O vilão, Dr. No, foi inspirado no Dr. Fu Manchu e interpretado por Joseph Wiseman. A primeira Bond girl foi Ursula Andress, que virou estrela depois disso. Mas o elemento mais importante para o sucesso desse primeiro filme foi o ator principal, Sean Connery. Ele não era o James Bond dos sonhos de Ian Fleming - que queria David Niven - mas o escritor acabou se rendendo ao charme e sucesso que Connery obteve no papel. Note que nesse filme não havia outro elemento que marcaria a série, os gadgets mirabolantes.
O primeiro, de "Moscou Contra 007" (1963), era simples: a maleta que depois foi chamada de 007 e que continha uma adaga embutida, uma lata de talco que ocultava uma bomba de gás lacrimogêneo, um rifle AR-7 disfarçado mais 25 munições e 25 moedas de ouro. Neste segundo filme, aparece a primeira bond girl russa, Tatiana Romanova, que, como suas sucessoras foi interpretada por uma atriz de outra nacionalidade, a italiana Daniela Bianchi, Miss Universo 1960. As outras soviéticas de araque foram Rosa Klebb (Lotte Lenya, austríaca) também em "Moscou contra 007"; Anya Amasova (Barbara Bach, americana) em "O Espião que me Amava" (de 1977, o melhor de Roger Moore); Kara Milovy (Maryam D'Abo, inglesa) em "Marcado para a Morte" (1987); Natalya Simonova (Isabella Scorupco, polonesa) e Xenya Onatopp (Famke Janssen, holandesa) em "Goldeneye" (1995). Assim, a ucraniana Olga Kurylenko (foto), de "Quantum of Solace", será a primeira atriz nascida na ex-USSR a ser Bond Girl, só que no papel de uma espiã... boliviana!
A longa série iniciada por "Dr. No" acabou em "Um Novo Dia para Morrer" (2002), o 20o da filmografia oficial de 007, em que foram homenageados os 19 filmes anteriores em diversos detalhes dispostos ao longo da narrativa. Também se chegou ao exagero máximo nas bugigangas tecnológicas, como o carro invisível e a cirurgia plástica genética capaz de transformar um coreano num caucasiano. A arma de destruição em massa, por outro lado, era reciclada de "Os Diamantes são Eternos": um canhão laser montado num satélite capaz de destruir qualquer alvo na Terra. Como o 11 de setembro provou, não é necessária alta tecnologia para causar o máximo de danos, e a fórmula vilão-com-arma-superpoderosa caiu em desuso.
Com "Cassino Royale", James Bond foi reinventado para se tornar um Jason Bourne (mesmas iniciais?) que trabalha para o governo. Em "Goldeneye" foi tentado algo assim, mas sem a mesma profundidade. Mantendo a mesma M e Q de Pierce Brosnan, o novo Bond acaba de ganhar a licença para matar e como nunca antes, algo que aconteceu no filme anterior - a morte da namorada - vai pautar Bond em sua nova aventura.
Já tem gente chamando Daniel Craig de "Bond Supremo", o que é um desrespeito a Sean Connery, que tornou o personagem um ícone cultural dos anos 60. Simplesmente não existiria a franquia sem o hoje semi-aposentado ator escocês. Craig merece ser o segundo James Bond por ter ressuscitado o personagem que já ameaçava virar uma autoparódia, sem a Guerra Fria que o definia. Em terceiro, afetivamente deveria indicar Roger Moore, o 007 mais prolífico, mas acho que empata com Pierce Brosnan. Já George Lazenby e Timothy Dalton disputam quem foi o pior.
Do alto de 30 anos acompanhando a série regularmente, seleciono alguns dos melhores personagens da série.
Vilões
Um bom vilão tem que falar macio enquanto oculta uma crueldade sem limites. E para um bom vilão da série James Bond, é preciso ter um plano diabólico capaz de afetar todo o planeta. Por isso o patético Le Chiffre de "Cassino Royale" ficou de fora.
Auric Goldfinger - O alemão Gert Fröbe já tinha participado de alguns filmes famosos - "O Mais Longo dos Dias" (assim como o próprio Sean Connery) e "Paris Está em Chamas?" - mas certamente é mais lembrado como o milionário inescrupuloso que tenta açambarcar o mercado de ouro contaminando as reservas americanas em Fort Knox. Como num bom seriado dos anos 40, tentar cortar 007 ao meio, não com uma serra circular, mas com um laser.
Ernst Blofeld - Foram quatro atores a interpretar o Número 1 da Spectre. O primeiro foi Anthony Dawson, que só aparece de costas em "Moscou contra 007" e "Chantagem Atômica" acariciando um gato. Donald Pleasence (foto) finalmente dá rosto ao personagem em "Só se Vive Duas Vezes", seguido por Telly Savalas em "A Serviço Secreto de Sua Majestade" e Charles Grey em "Os Diamantes são Eternos". O vilão desaparece durante os quatro primeiros filmes de Roger Moore, só retornando brevemente em "Somente para Seus Olhos", na tradicional seqüência antes dos créditos. Final inglório para um grande vilão.
Rosa Klebb - A ex-chefe dos assassinos da Spectre em "Moscou contra 007" é vivida por Lotte Lenya, viúva e Kurt Weil e estrela do famoso Ensemble de Bertold Brecht. É ela que escolhe Red Grant para matar Bond e quase liquida o agente britânico ao final com seu sapato-canivete com ponta envenenada.
Karl Stromberg - O mega-armador que quer destruir o mundo da superfície e para isso seqüestra submarinos nucleares em "O Espião que me Amava" foi interpretado pelo alemão Curd Jurgens, que na juventude contracenou com Brigitte Bardot em "E Deus fez a Mulher" e foi antagonista de Robert Mitchum em "A Raposa do Mar". Galã na juventude, aparece nesse filme como um apreciador de coisas belas, como a sua mega-base submergível, sua piloto Naomi e a Major Anya Amasova, a quem sequestra - para variar.
Emilio Largo - O Número 2 da Spectre aparece em "A Chantagem Atômica" e é vivido pelo italiano Adolfo Celi, ex-marido de Tonia Carrero. Grande, com peitoral de cantor de ópera e um tapa-olho para dar mais estilo, Largo era inteligente, cruel e ainda bom de briga o suficiente para sair no braço com James Bond. O cara era muito mau, pois além de manter a pobre Domino Derval como escrava sexual, mandou matar o irmão dela e depois a tortura quando fica sabendo que ela o traiu com 007. Tonia Carrero, entretanto, jura que Adolfo era um amor de pessoa.
Alec Trevalyan - Ex-parceiro de Bond, revela-se agente duplo em "Goldeneye". Interpretado por Sean Bean, especialista em fazer bad guys, marca o retorno de um vilão armado com uma arma de destruição em massa, após os bandidos meia-boca enfrentados por Timothy Dalton. Entra na lista por causa disso, porque ele foi um vilão melhor para Harrison Ford em "Jogos Patrióticos".
Capangas
Uma mente criminosa precisa sempre de um bom capanga para fazer o serviço sujo. Se ele usar um método peculiar para matar, melhor ainda.
Oddjob - O assassino coreano de "Goldfinger" foi interpretado pelo havaiano Harold Sakata, um lutador olímpico medalhista de prata em Roma. Além de ser muito forte, ele tinha como arma um chapeú de metal que arremessava como um frisbee. Como na mão não dava para ganhar dele, James Bond o eletrocutou em Fort Knox.
Jaws - Único capanga a aparecer em dois filmes da franquia, "O Espião que me Amava" e "O Foguete da Morte", o assassino dos dentes de aço interpretado por Richard Kiel, ator com 2,17 metros, era invencível numa luta mano a mano. Seus dentes eram capazes de matar um tubarão e cortar até o cabo do bondinho do Pão de Açucar! Uma curiosidade: além de "O Espião que me Amava" ele lutou - ou bateu - na atriz Barbara Bach em outro trabalho, "Comando 10 de Navarone", estrelado por outro capanga da série 007, Robert Shaw.
Red Grant - O assassino de "Moscou contra 007" é um ator que se tornaria importante nos anos seguintes: Robert Shaw (na foto, com Lotte Lenya como Rosa Klebb), mais conhecido do público como o pescador Quint, de "Tubarão". Ele é um inglês renegado que trabalha para a Spectre e deve matar Bond como conclusão de um plano apra desacreditar o agente e o Serviço Secreto Britânico. Seu métido favorito é o fio de aço que estrangula e corta a garganta. Sua luta com 007 no trem é um dos momentos mais violentos e emocionantes de toda a série.
Tee Hee - O assassino com uma prótese de gancho ao invés da mão direita de "Viva e Deixe Morrer" foi um dos que mais trabalho deu a James Bond. Intepretado pelo americano Julius Harris, era capanga de Kananga, vivido por Yaphet Koto, que usava vodu para controlar sua gente na Jamaica e assumia a identidade do gangster Mr. Big quando lidava com o tráfico no Harlem.
Mr. Kidd e Mr. Wint - A impagável dupla de assassinos gay de "Os Diamantes são Eternos" complementavam o clima camp do filme. Feito logo após a tentativa de emplacar George Lazenby como 007, os produtores resolveram pagar o que Sean Connery queria para voltar ao papel e deram um clima mas típico da nova década para ganhar a audiência americana. Daí o filme ser rodado em grande parte em Las Vegas, entre mocinhas desinibidas (uma delas, Plenty O'Toole, vivida pela irmã de Natalie Wood, Lana) que se atiravam em cima dele e uma dupla de capangas que fazia uma casal homossexual.
Mulheres fatais
Muitos tentam matar 007, mas a coisa complica quando é uma bela mulher. O molóide do Pierce Brosnan quase foi morto por três delas.
Fiona Volpe - Bela, cruel e ninfomaníaca, a assassina de "Chantagem Atômica" vivida pela italiana Lucian Paluzzi foi o modelo de Fatima Blush (do não-oficial "Nunca mais Outra vez") e Xenya Onatopp ( de "Goldeneye"), ou seja, tenta matar Bond depois de transar com ele. É ela que pilota um dos gadgets mais legais de toda a série, uma moto equipada com lança-foguetes.
Elektra King - Interpretada pela atriz francesa Sophie Marceau, em "O Mundo não é o Bastante" é a herdeira de um magnata do petróleo que ela mesma mandou matar. Seduz o psicopata Renard para que seja o laranja da operação que lhe renderá uma fortuna e ainda faz com que 007 se apaixone por ela. A rigor, ela deveria entrar na categoria Vilões, já que é o cérebro por trás de toda a trama.
Xenya Onatopp - Assassina a mando de Alec Trevanyan, é vivida pela mesma Famk Janssen que ficaria famosa como Fênix dos "Xmen". Mas ela é muito melhor sufocando suas vítimas entre suas coxas - ui! - do que vaporizando inimigos no último filme da triologia mutante. Onatopp é um trocadilho infame, especialmente para quem gosta de transar e matar on top...
Miranda Frost - Loura gelada (frost), a agente dupla faz com que o James Bond de Pierce Brosnan de apaixone - de novo! - por ela em "Um Novo Dia para Morrer". Estréia da atriz Rosamund Pike, de "Orgulho e Preconceito".
May Day - Papel sob medida para a cantora Grace Jones, ela é a assassina de Max Zorin em "Na Mira dos Assassinos". Alta, andrógina e musculosa, não sei o que era pior para o pobre James Bond de Roger Moore aos 57 anos na época: brigar ou fazer amor com ela. Ofuscou a ex-pantera Tanya Roberts, uma das bond girls mais sem graça.
Naomi - A piloto pessoal de Stromberg aparece muito pouco em "O Espião que me Amava" e é a única da lista que não rala e rola com 007. Mas ela foi vivida por Caroline Munro, uma rainha dos filmes B dos anos 70, entre eles "As Viagens de Simbad" e "Drácula no Mundo da Minissaia", e que era um pedaço de mau caminho. Pena que James Bond teve que mandá-la para o espaço com um missil polaris de seu carro-submarino...
Bond Girls
Costuma-se classificar como bond girlr todas as moças que participaram de uma filme de James Bond. Eu não acho. Bond girl é a garota com quem James Bond transa no fim do filme, marca registrada da série tanto quanto a abertura com o cano da arma apontada para o agente secreto. A mistica começou com Ursula Andress saindo do mar com um biquini branco e uma concha na mão em "O Satânico Dr. No", então não poderia ser outra a bond girl número 1.
Honey Rider - Ursula Andress virou um ícone pop dos anos 60 graças à sua aparição em "O Satânico Dr. No" intepretando a moça que vivia de coletar conchas raras na ilha em que aconteciam coisas misteriosas na costa da Jamaica. Ingênua mas vingativa, ela matou o homem que a estuprou com uma aranha viúva negra. No livro, o Doutor No a amarra nua na praia no caminho de milhares caranguejos, mas a produção do filme poupou a pobre Ursula do suplício, provavelmente por falta de orçamento para obter tantos crustáceos amestrados.
Pussy Galore - A atriz Honor Blackman foi a bond girl mais velha aos 37 anos, como a líder de uma quadrilha de garotas-aviadoras. Seu nome é um trocadilho abominável, especialmente para uma personagem que deveria ser lésbica (no romance era explícito, mas no filme há insinuações). Foi a primeira a encarar uma briga e se era chegada numa pussy, James Bond tratou de curá-la dando-lhe um golpe de judô num monte de feno.
Anya Amasova - Em "O Espião que me Amava" tudo era top: vilão, capanga, mulher fatal e a bond girl, vivida pela futura senhora Ringo Starr, Barbara Bach, que era agente Triplo X muito antes de Vin Diesel, só que a serviço da KGB. Era tão culta, sofisticada e esperta quanto Bond, com quem fez a princípio uma competição divertida. Na verdade, a moça buscava vingança contra o assassino de seu amante, também espião soviético. Adivinha quem era?
Vesper Lynd - Um dos trunfos de "Cassino Royale" era a bond girl vivida pela bela e talentosa Eva Green, que dá profundidade a uma função muitas vezes restrita a enfeitar o filme. Ela resiste como pode a Bond, mas acaba se sacrificando por ele. Na seqüência, "Quantum of Solace", 007 vai em busca dos responsáveis pela traição e morte dela.
Miss Solitaire - A estréia de Roger Moore como James Bond também foi a estréia de Jane Seymour no cinema. "Viva e Deixe Morrer" tinha ainda música-tema de Paul McCartney, que foi regravada muitos anos depois pelo Guns 'n Roses. Jane, posteriormente estrela de "Em Algum Lugar no Passado" e rainha dos telefilmes, era a vidente que só mantinha os poderes proféticos enquanto continuasse virgem. Depois que conheceu 007, não conseguia nem prever se ia chover amanhã.
Jinx - Halle Berry foi a primeira bond girl vencedora do Oscar - no ano do lançamento do filme "Um Novo Dia para Morrer". A agente da Agência Nacional de Segurança dos EUA foi a primeira negra a ser escalada como bond girl principal, já que Rosie Carver, de "Viva e Deixe Morrer", era secundária. Além de amante, era colega e competidora de Bond, como Anya de "O Espião que me Amava" e Wai Lin de "O Amanhã Nunca Morre".
Tracy di Vicenzo - O único James Bond de um filme só, George Lazenby estrelou o que muitos chamam de melhor da série, "A Serviço Secreto de Sua Majestade", cuja música-tema foi usada pelo infame Amaral Neto, o repórter a serviço nada secreto da ditadura brasileira . Se ninguém conhecia George Lazenby, a mocinha Diana Rigg era famosa por conta do seriado inglês "Os Vingadores", que virou um filme na década passada com Uma Thurman à bordo de um macacão de couro negro. Tracy foi a única que conseguiu levar 007 ao altar, para ser em seguida morta pelo arquivilão Blofeld.
As francesas - Além de Eva Green, outras duas atrizes francesas foram bond girls. A primeira foi Claudine Auger, ex-Miss França, como Dominique "Domino" Derval, que 007 resgata das mãos do malvado Emilio Largo em "A Chantagem Atômica". A outra foi Carole Bouquet, estrela do último Buñuel, "Esse Obscuro Objeto do Desejo". Ele viveu Melina Havelock, meio inglesa, meia grega, que busca vingança com sua besta após seu pai ser morto por assassinos contratados. Curiosamente, no ano do lançamento do filme Frank Miller cria sua maior personagem original para a Marvel, Elektra, cuja origem é muito parecida.
2 comentários:
Caramba... Eu já assisti TODOS os filmes de 007 e recomendo a leitura deste post. É um resumo perfeito da história deste ícone do cinema mundial.
Barbara Carrera, quizá la mejor Bond Girl de todos los tiempos
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