terça-feira, 2 de junho de 2009

Do Brancotinto ao Mondovino


O casal Marcelo e Josi apresentando seu "fillho" a amigos e clientes


Uma vez escrevi que o Le Triskell era uma ilha de civilidade em Indaiatuba e fui citado por Kleber Patrício, o que muito me honrou. Pois agora podemos dizer que de uma ilha ensaiamos um pequeno arquipélago, com o Brancotinto.

Mais que uma loja de vinhos, é um lugar degustar a vida. Quem como eu já foi com amigos tomar uma garrafa, fumar um charuto (thanks, Vivian) e beliscar um dos acepipes assinados pelo chef Igor sabe o que eu estou falando, assim como os freqüentadores das degustações promovidas pela sommeliére e proprietária do espaço, Josi Pieri.

Na terça passada, dia 26, fomos apresentados ao documentário produzido por Marcelo Wollermann e Josi durante sua viagem pelo Cone Sul, no início do ano. O vídeo foi apresentado a um grupo de clientes e amigos durante uma degustação deliciosa. O chileno Pacifico Sur Reserva 2005 Cabernet Sauvignon-Merlot me surpreendeu pelo aroma de frutas vermelhas e pimentão e sabor intenso, mesmo sendo o Melipal Malbec 2006, de Mendoza, a estrela da noite.

Marcelo é um grande profissional de vídeo e aliado à expertise e busca insaciável pelo conhecimento de Josi, realizaram um trabalho excepcional, embora mais indicado a iniciados na enofilia. Mas mesmo que está engatinhando no mundo dos vinhos pode usufruir o prazer com que os entrevistados falam de seu trabalho, de seus vinhedos, de seus terroirs e, acima de tudo, de seus vinhos. O documentário pode ser visto no site Brancotinto.TV.



Ontem, segunda, tivemos uma degustação promovida pela importadora Lusitana, especializada – como não poderia deixar de ser – em vinhos e azeites portugueses. Um dos produtores estava lá, José Castelo Branco, da Sociedade Agrícola Encosta do Guadiana, no Alentejo. De sua lavra foram desgustados o branco Herdade Paço do Conde 2007; o Herdade do Paço do Conde tinto 2004 e o ponto alto da noite, o Herdade Paço do Conde Reserva Tinto 2004. A Lusitana também nos apresentou dois vinhos de outro produtor, a Cachamoa: o Barão do Sul Alentejo Colheita Selecionada tinto 2003 e o Barão do Sul Garrafeira tinto 2002, este da região das Terras do Sado.



Em uma semana, tive a oportunidade rara de confrontar bons produtos do Novo e do Velho Mundo e suas diferenças. O produtor Castelo Branco defende as cores da Europa, onde o terroir e a tradição enfrentam os varietais e a tecnologia das Américas, Austrália e África do Sul. É o dilema apresentado no já clássico “Mondovino”, o documentário de Jonathan Nossiter que denunciava a ditadura da madeira e dos altos teores alcoólicos impostas pelo poder do crítico Robert Parker, do consultor Michel Rolland e da empresa Mondavi, sediada no Vale do Napa, Califórnia. Em contrapartida, produtores tradicionais da Europa que se recusavam a seguir a receita de bolo tinham dificuldade em vender seus produtos, que mantinham as características regionais de décadas e até séculos de tradição.

Seja como for, o fato é que – influenciado pelo documentário ou não (eu aposto que sim) – o mundo da enologia mudou e hoje a madeira está perdendo espaço para a fruta e o menor teor alcoólico e maior acidez de alguns vinhos do Velho Mundo começam a cair no gosto do consumidor brasileiro.

Aliás, um dos entrevistados do documentário do Marcelo manifesta seu encantamento pelos mercados da Grã-Bretanha e do Brasil, que consomem produtos do mundo inteiro, ao contrário de, por exemplo Chile e Argentina, que são extremamente bairristas em matéria de vinho. Isso provavelmente se deva à nossa pobre tradição vitinícola, cujo exemplar emblemático é o “Sangue de Boi”. Não que não sejam feitos bons vinhos em diversas regiões do País, mas, além de ter que encarar o preconceito construído durante anos de predominância de péssimas e até desonestas beberagens, eles enfrentam ainda condições climáticas não ideais e preços não competitivos em relação aos importados do Cone Sul, que chegam sem imposto ao Brasil. Como mais de um especialista já disse – e é reforçado no vídeo da Brancotinto – o terroir brasileiro é ótimo para espumantes. Para o resto, a tecnologia tem que intervir.

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