quinta-feira, 5 de março de 2009

Quem quer dinheirooo?


Uma coisa é “Quem quer ser um milionário?” como filme, e nesse aspecto eu não o acho grande coisa. Outra é como produto cultural e vencedor do mais importante prêmio do cinema, e aí acho oportuno.
Chamado de “conto de fadas” por seus autores, a trama é tão inverossímil quanto é brutalmente real o pano de fundo de uma Índia dividida pela desigualdade econômica, pelo ódio religioso e pela exploração infantil mais abominável. Esse desequilíbrio cria desconforto se percebido; caso contrário, o espectador embarca na história de Jamal em busca de seu grande amor.
Virei fã de Danny Boyle já em “Cova Rasa” (1995), e o seu trabalho seguinte, o sensacional “Trainspotting” (1996) só confirmou minha admiração. Mas ele se aventurou em Hollywood, com resultados que variaram entre decepcionante, “Por uma vida menos ordinária” (1997), e desastroso, “A Praia” (2000). Recuperou parte do prestígio com “Extermínio” (2002) e “Sunshine” (2007), sem no entanto o impacto de seus dois primeiros filmes. Acho que Boyle ficou obcecado por uma revanche com Hollywood.
O caminho para a volta por cima foi Bollywood, unindo um roteiro que parece uma transposição de Charles Dickens para as favelas de Mumbai com a câmera ágil que deu fama ao diretor. “Cidade de Deus”? É óbvio que inspirou a cena da perseguição pelas ruelas no início. E seu eu citei Dickens, os vilões do escritor vitoriano – justamente no período em que a Índia era a jóia mais valiosa da coroa britânica – eram muito mais tridimensionais que os monstros morais do filme de Boyle. E o herói Jamal, por sua vez, é tão bonzinho que dá vontade de bater nele.
Achei o filme emocionalmente desonesto e manipulador, algo que até a apóloga Isabela Boscov, da Veja, reconhece. Mas ele é oportuno dentro do ponto de vista histórico, do qual não se pode dissociar nenhum produto cultural. O Oscar nunca foi um premio de estética cinematográfica, mas do que seus membros acham importante ressalvar no momento. Se há dois anos, ainda não era o momento de celebrar o amor homossexual de “Brokeback Mountain”, em 2009 é hora de saudar a esperança e a globalização. Nesse aspecto, os oito premios da Academia para o filme tem lógica, e a Índia toda comemora como se fosse a vitória de um filho legítimo. Mas quem saiu ganhando é Barack Obama, que viu sua mensagem “We can” repercutir na poderosa indústria do cinema.
By the way, achei o final mais próximo do “Zatoichi”, de Takeshi Kitano, do que dos longos filmes de Bollywood.

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