sexta-feira, 28 de março de 2008

Fenomenal atacante


Não é preciso eu dizer: quem escreveu o texto abaixo foi o camisa 9 do maior time de todos os tempos na opinião dos ingleses - os maiores estudiosos em futebol e guerra - , a Seleção Brasileira de 1970.

Tostão
Folha de São Paulo. Brasil, novembro de 2004.


Romário fez nos Estados Unidos a sua despedida internacional do futebol. Ele não foi o mais premiado centroavante de todos os tempos, nem sei se foi o melhor, mas foi o mais genial, o que mais me fascinou.

Pena que os jovens não assistiram ao Romário nos seus grandes momentos, da década de 80 até a Copa de 98, na França, quando foi cortado da seleção brasileira por contusão. Antes do Mundial de 94, nos EUA, Romário jogava no Barcelona e já era o melhor atacante do mundo, o que foi confirmado na Copa.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso fazer muitos gols, de todos os jeitos, sendo muitos maravilhosos, como fez o Romário. Parafraseando o poeta, que me perdoem os artilheiros, mas a beleza do gol é fundamental.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso sair da área para receber a bola, tabelar, ter uma ampla visão e dar ótimos passes para os companheiros marcarem gols, como também fazia o Romário.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso ter as pernas fortes, uma excepcional "explosão muscular" e muita velocidade para receber lançamentos longos, como tinha o Romário. Ele chegava na bola sempre antes do zagueiro.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso dominar a bola em pequenos espaços, não deixá-la fugir nem ficar colada aos pés e finalizar rápido e com eficiência, como fazia o Romário. Quando era necessário, ele driblava o seu marcador antes de chutar. Para ser um fenomenal centroavante, é preciso não ficar ansioso diante do goleiro e finalizar com o corpo ereto, com o pé de apoio paralelo e próximo à bola, olhando para o goleiro e não para a bola, como fazia o Romário.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso, mesmo sendo baixinho, ter uma boa impulsão, se colocar bem, olhar para o goleiro e cabecear com os olhos abertos no canto, como fazia o Romário.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso, no momento em que é realizado o lançamento, para não entrar em impedimento, colocar o corpo de lado para facilitar a arrancada inicial, ter um olhar na bola e no companheiro que vai dar o passe e outro nos movimentos e na posição do zagueiro, como fazia o Romário. Quando o defensor virava o corpo, ele já estava longe.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso ser esperto, não ficar colado ao zagueiro, se afastar um pouco e "se fingir de morto", para então conseguir enganar o defensor, como fazia o Romário.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso antever o passe, o lançamento, e se antecipar ao zagueiro, como fazia o Romário. A bola não procura o artilheiro. Ele é que sabe antes dos outros aonde a bola vai chegar.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso ser imprevisível, fantasista e inventivo, como era o Romário.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso ser conciso, economizar gestos, simplificar, não se enrolar com a bola e executar bem o que é fundamental, como fazia o Romário. Talento é tornar simples o que é complexo.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso treinar o que se vai executar no jogo, como fazia o Romário. Numa ocasião, fui entrevistá-lo pela ESPN Brasil em Valência, na Espanha, e o Romário estava fora do treino por causa de uma contusão. Perguntei o que havia acontecido, e ele respondeu: "Não tenho nada. Só não quero treinar dois toques num campo pequeno. Isso não acontece na partida". Os técnicos de todo o mundo adoram este treinamento.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso ter muita confiança e saber esperar os poucos momentos que terá para brilhar, como fazia o Romário. Não dá para ser craque durante todo o jogo e em todas as partidas.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso ser solidário, participar do jogo coletivo, entretanto é necessário também ser ambicioso, egocêntrico, pretensioso e ter a convicção de que só ele vai decidir a partida, como tinha o Romário.

Para ser um fenomenal centroavante, é preciso fazer sem pensar, sem saber por que faz, como fazia o Romário.

O craque não planeja; faz. O craque não tem explicação; ele é.

"Não sei explicar, mas desexplicar." (Manoel de Barros)

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Como andaram pichando na época da última visita de João Paulo II ao Rio: Se Deus é 10, Romário é 11!

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