quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Memórias olímpicas


Nestes dias pré-olimpíadas estamos sendo bombardeados com matérias sobre a China, as chances brasileiras de medalhas, o cotidiano dos atletas na Vila Olímpica, etc. Minhas primeiras lembranças olímpicas remontam vagamente de Munique. Lembro-me vagamente à referência da “marmelada” do jogo final de basquete masculino entre EUA e URSS, em que a segunda bateu a primeira vez numa final importante por conta de um erro na contagem de tempo; e a um bigodudo chamado Mark Spitz que havia se tornado o maior herói dos jogos. Não me lembro na época da história do atewntato á delegação israelense, não sei se por conta do regime militrar que filtrava esse tipo de reportagem ou por não me interessar mesmo por isso aos nove anos de idade. Naqueles jogos, o Brasil levou dois bronzes, um no salto triplo com Nelson Prudêncio e outro no judô com Chiaki Ishii, acho que a primeira na modalidade.
Já de Montreal, em 1976, tenho lembranças mais vívidas, da extraordinária Nadia Comanecci e suas performances inacreditáveis nas assimétricas e trave; e da espetacular final no vôlei masculino entre Polônia e URSS, vencido pela primeira num dos jogos mais longos até então (na época, não havia tié breake o quinto set só terminava quando uma das equipes colocava dois pontos de vantagem sobre a outra, após a marcação do 15º ponto). O Brasil ganharia mais uma medalha de bronze no salto triplo, agora com João do Pulo, e uma no iatismo na classe Flying Dutchman, com Peter Ficker e Reinaldo Conrad.
Moscou, 1980, foi marcado pelo boicote dos americanos e nações capacho como a Alemanha Ocidental e a França, por conta da invasão do Afeganistão. Ficaram marcados o “roubo” contra nosso João do Pulo – que teve seu melhor salto “queimado” injustamente pela arbitragem para beneficiar o soviético Yaak Uudmae – e a figura do ursinho Misha chorando no encerramento dos jogos. O Brasil conseguiu duas medalhas de outro no iatismo, uma de bronze novamente com João do Pulo (já recordista mundial) e outra no revezamento 4x200m livres na natação.
Em Los Angeles, 1984, os ianques levaram o troco e quase todo bloco soviético, mais Cuba, deixaram de ir à ensolarada Califórnia. Foram inesquecíveis as imagens do homem-voador que sobrevoou o estádio olímpico com sua mochila a jato na abertura e a a maratonista suíça Gabrielle Andersen-Scheiss se arrastando para alcançar a linha de chegada, numa dramática ilustração do espírito olímpico. O vôlei masculino havia chegado a um passo da medalha de ouro, mas acabou derrotado pela dona da casa, a quem havia batido numa fase anterior por 3 a 0. Joaquim Cruz tornou-se herói olímpico ao ganhar a medalha de ouro nos 400m rasos. Ricardo Prado, nadador que chegara a bater o recorde mundial, levou prata nos 400m medley, assim como a seleção de futebol, o judoca Douglas Vieira e os iatistas Torben Grael, Daniel Adler e Ronaldo Senfft. Os judocas Luis Onmura e Walter Carmona completaram o quadro de medalhas brasileiros com seus bronzes, na melhor participação do país em Olimpíadas até então.
Seul, 1988, representou a volta da normalidade e do duelo URSS x EUA. Sem que ninguém sequer desconfiasse, entretanto, aqueles seriam os últimos jogos da Guerra Fria. Um ano havia se passado desde que a seleção de basquete americana havia sofrido a primeira derrota da história em seu território, para o Brasil, na final do Jogos Pan-americanos, e uma nova humilhação aguardava o Tio Sam no longínquo oriente: uma medalha de bronze no esporte que eles inventaram e até então praticavam num patamar que sempre julgaram muito acima do resto do mundo. A União Soviética do gigante Sabonis, campeão, e a Iugoslávia do extraordinário Petrovic, vice, mostraram aos americanos que, se quisessem reconquistar o ouro olímpico, teriam que levar o que de melhor eles tinham. E foi assim que nos jogos seguintes surgiria o Dream Team. No Brasil, Aurélio Miguel fez história com seu ouro no judô, mais as medalhas de prata no futebol (de novo!) e de Joaquim Cruz nos 800m; e os bronzes para Robson Caetano nos 200m rasos, Lars Grael e Clinio Freitas na classe Tornado e Torben Grael e Nelson Freitas na Star.
Barcelona, 1992, foi o ano do Dream Team, o melhor time de basquete jamais formado, reunindo os gênios Michael Jordan e Magic Johnson no auge da forma (ainda que Johnson estivesse se despedindo das quadras por causa do HIV) tendo Pat Ewing, Charles Barkley, David Robinson, Scottie Pipen, Clyde Drexler, Chris Mullin, Karl Malone, John Stockton, Christian Laettner e o lendário Larry Bird como coadjuvantes. Foi a grande geração da NBA que vi jogar –graças à Bandeirantes, que exibia o campeonato americano em tempos pré-TV a cabo. Na mesma Olimpíada, outro Dream Team batia todos seus adversários inapelavelmente, só que de surpresa. A seleção brasileira masculina de vôlei surpreendeu todo mundo e ganhou a medalha de outro de forma categórica. Durante dois anos foi o time a ser batido, e o foi. Achávamos que aquele jovem time tinha jogo para dominar os próximos jogos, mas seriam necessários 12 anos para retornar ao lugar mais alto do pódio. Com o ouro conquistado também por Rogério Sampaio no judô e a prata de Gustavo Borges nos 100m livres, o Brasil ganhou menos, mas melhores medalhas que em Seul e Los Angeles.
Atlanta, 1996, foi polêmica já na escolha da sede. Como se tratava do centenário dos Jogos da Era Moderna, todos esperavam que a cidade escolhida fosse Atenas, mas a capital da Geórgia atropelou as pretensões gregas com um caminhão de grana. Apenas oito anos depois os helenos teriam sua Olimpíada. Como se fosse um castigo, Atlanta sofreu o primeiro atentado durante os jogos desde Munique, embora não se saiba até hoje direito quem ou porque a bomba foi deflagrada. Foi a primeira Olimpíada em que as ex-repúblicas soviéticas disputaram separadas – e consequentemente, a primeira vitória americana na corrida das medalhas desde Los Angeles. O Brasil teve sua melhor participação em todos os tempos, com três outros – no vôlei de praia com a dupla Jaqueline e Sandra, no iatismo classe Star com Robert Scheidt e na Star com Torben Grae e Marcelo Ferreira - ; três pratas – basquete feminino, Gustavo Borges nos 200 m livre e vôlei de praia com Mônica e Adriana - e 9 bronzes – revezamento 40x 100m, judô (Aurélio Miguel e Henrique Guimarães), natação (Gustavo Borges e Xuxa), volei feminino, futebol masculino, equitação por equipe e vela classe Tornado, com Torben Grael e Kiko Pellicano.
Em contraste com os Jogos norte-americanos, Sidney 2000 foi uma decepção para o Brasil. Nenhuma medalha de ouro, seis de prata e seis de bronze.Em compensação, Atenas-2004 marcou um novo recorde para o País, com cinco ouros - voleibol masculino, hipismo para Rodrigo Pessoa e Baloubet du Rouet (o cavalo que refugou quatro anos antes), vôlei de praia masculino (Ricardo e Emanuel), vela na Star (Robert Scheidt) e Star (Torben Grael e Marcelo Ferreira) – ; duas de prata – vôlei de praia feminino (Shelda e Adriana Behar) e futebol feminino - ; e três bronzes – judô para Flavio do Canto e Leandro Guilherme e maratona para Vanderlei Cordeirode Lima, após o bizarro incidente com o ex-padre maluco que quase o tirou da corrida.
Amanhã, começam os Jogos de Pequim (aonde foi parar a grafia beijing adotada anos atrás?) e o Brasil pela primeira vez teve condições de realizar uma preparação verdadeiramente olímpica (Olimíáda na verdade é o período de quatro anos entre os jogos e não a competição propriamente dita). A máxima do Barão de Coubertin – o importante é competir - continua valendo só pra inglês ver: o que todo mundo quer saber é quantas medalhas vamos trazer para casa. Não vai mudar a vida de ninguém mas vai dar um alento na nossa auto-estima nacional e justificar a grana que o Comitê Olímpico Brasileiro arrecadou e investiu.

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