Ontem aconteceu a pré-estréia de “Linha de Passe” no Multiplex Topázio em Indaiatuba, com a presença dos dois atores que estudaram e começaram juntos no teatro no COC de Indaiatuba, João Baldasserini e José Geraldo Rodrigues. Os dois estavam emocionados em apresentar seu trabalho para familiares, amigos e ex-colegas de escola, mas quem talvez estivesse mais comovido era o Paulinho Lui, responsável pela sala, por estar recebendo o lançamento nacional de um filme tão importante, ganhador do prêmio de Melhor Atriz no Festival de Cannes, para Sandra Corveloni.
A crítica internacional considerou este o melhor filme de Walter Salles desde o consagrador “Central do Brasil” há dez anos. Eu acho que é a melhor obra dele – e de Daniela Thomas – desde “Terra Estrangeira”, que considero superior a “Central do Brasil”.
Segundo João, a idéia era fazer das imagens uma linha de passe entre as histórias dos quatro irmãos e sua mãe, e isso é feito de forma magistral já na abertura, antes do próprio título do filme. A abertura e o desfecho remetem às montagens de Francis Ford Coppola nos clímax dos três “Poderoso Chefão”, marca registrada da trilogia. Salles já havia feito uma citação literal de outra obra-prima do cinema, “Rastros de Ódio”, em “Central do Brasil”, quando Vinícius de Oliveira aparece emoldurado na porta da casa em que morou, remetendo à cena final de John Wayne no clássico de John Ford. Não são meros exercícios de cinefilia: o diretor de expedientes consagrados para daí fazer paralelos com seus personagens. Vinícius em “Central....” não pertence a lugar nenhum, como Wayne em “Rastros...”. Os personagens de “Linha de Passe” buscam uma saída como Al Pacino nos três “Chefões...”, que tenta tirar sua família do crime.
Outra metáfora recorrente é o da pia entupida na casa da família protagonista. Na cena em que vai parar na festinha na casa dos riquinhos, Vinícius-Dario vai matar a sede e observa a água correr fácil na cada deles. No final, ele é quem “desentope” o ralo, literalmente e... simbolicamente? Na seqüência acontece as cenas climáticas, com Gera-Dinho decidindo dua relação com Deus; Kaíque-Reginaldo sua busca pelo pai e sua paixão por ônibus; João-Dênis se flerte com a marginalidade e Vinícius-Dario a encruzilhada entre o sonho de ser jogador e a vala comum do subemprego.
“Linha de Passe” corre sobre o fio da navalha do clichê, mas consegue escapar deles com graça e beleza. O desfecho aberto deixa a cada espectador a interpretação de esperança ou desespero. Como a origem das histórias dos personagens centrais eram documentários – sobre evangélicos, “peneiras”, motoboys, torcidas e do menino que rouba um ônibus – o caminho dos cineastas até o destino final de suas histórias era repleta de armadilhas. Nesse caso, a conversa com os atores foi esclarecedora. Gera conta que, no documentário original, a paraplégica andava ao ser desafiada pelo pastor. Na ficção, pareceria forçado. João diz que Salles revelou a ele que Vinícius tinha convertido o pênalti, mas isso foi mudado na versão final para evitar o clichê do happy end. Ao optar pela desfecho com o ônibus de afastando rumo ao nascer do sol – talvez uma referência à cavalgada rumo ao crepúsculo de tantos westerns – os cineastas escolheram pela beleza imagética, mas poderosa que palavras explicativas ou um final que nunca é na vida real.
“Qualquer que seja a escolha final em relação à ação em desenvolvimento, deve ser aquela que mais seguramente mantenha a atenção do público. Em resumo, pode-se dizer que o retângulo da tela deve ser carregado de emoção”. Alfred Hitchcock em “Hitchcock-Truffaut Entrevistas”.
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