Será que se deve lamentar a morte de alguém que teve uma vida longa e plena de realizações? Um homem que na juventude podia ter todas as mulheres que quisesse e viveu um casamento de meio século. Um ator ambicioso que lutou contra o estigma da beleza e conseguiu ganhar seu Oscar já na velhice, sobreviveu à sua maior láurea vinte anos e obteve mais duas indicações, o que somam 10 na carreira. Um cara que amava as corridas e pilotou até os 80 anos. Um artista milionário que abriu um negócio que lhe rendeu outros milhões mas preferiu doar essa grana extra para a caridade. Um astro que começou no velho Star System e encerrou a carreira a Hollywood das grandes corporações. Um cara, segundo contou certa vez Gore Vidal, capaz de fazer uma mulher desmaiar só por ver o azul dos seus olhos.
Eu não lamento a morte de Paul Newman, mas invejo a vida dele. Não que tenha sido tudo um mar de rosas. Ele perdeu um filho para as drogas, mas ao invés de se amargurar, criou uma entidade para tratar de jovens viciados. Teve uma estréia tão ruim em "O Cálice Sagrado" que mais tarde, quando já era rico e famoso, mandou publicar um anúncio no jornal para que o público não o assistisse quando o filme passou na TV pela primeira vez. Seus lendários olhos azuis não distinguiam o verde do vermelho. Era daltônico.
Newman ganhou sua estatueta dourada por "A Cor do Dinheiro" (1987), num papel que 26 anos antes lhe havia dado a segunda indicação ao Oscar. Na verdade, ele estava bem melhor em "Desafio à Corrupção", mas na época seus olhos ofuscavam seu talento dramático. Quando fez sua primeira parceria com o amigo Robert Redford em "Butch Cassidy", ele, Newman, era o grande astro e Redford o galã em ascenção. Quatro anos depois, quando os dois voltaram a atuar juntos - sob a mesma batuta de George Roy Hill - Reford era o número 1 em hollywood e Newman começava a entrar na duvidosamente honrosa categoria de lenda de Hollywood.
Sua última aparição num filme foi em "A Estrada para Perdição", uma superprodução com astros como Tom Hanks, Jude Law e Daniel Craig quando nem sonhava em ser James Bond. Era baseada numa história em quadrinhos de Max Allan Collins e Richad Piers Rayners, que nada mais era que uam transposição do mangá "Lobo Solitário" para a América dos gangsters e da Depressão dos anos 30. Esta derradeira e marcante atuação - ele ainda dublaria um personagem de "Carros", da Pixar - lhe rendeu sua última indicação ao Oscar.
De seus filmes que vi, gosto do já citado "Desafio à Corrupção", sua primeira grande atuação; "O Indomado" (1963, em que, segundo Rubens Edwald Filho, ele cria seu persoangem-padrão), "Os Criminosos não merecem Prêmio" (1963, imitação de Hitchcock que saiu melhor que o original: ele faria com o Mestre "Cortina Rasgada", com resultado inferior); "Harper, o Caçador de Aventuras" (1966), em que ele encarna o detetive Lew Archer, de Ross Macdonald só que com outro nome, e ainda teria uma continuação); "Rebeldia Indomável" (1967, filme que faz "Oz" parecer brincadeira de criança); naturalmente "Butch Cassidy" (1969) e "Golpe de Mestre" (1973); "O Emissário de Mackintosh" (1973, filme de espionagem no espírito de "O Espiao que saiu do frio"); "O Veredicto" (1982), "A Cor do Dinheiro" e "A Roda da Fortuna" (1994). Ele teve duas incursões em Tenessee Williams: "Gata em teto de Zinco Quente" (1958), quando era muito cru e imaturo por papel; e "Doce Pássaro da Juventude" (1962), que não vi.
A história contada por Gore Vidal numa palestra que que assisti nos anos 80 é que certa vez ele estava andando por nova York com Newman, seu amigo e que costumava sair de casa disfarçado e de óculos escuros. A uma certa altura, o ator tira seu óculos para ver algo melhor quando uma senhora olhava na direção dele. Ao ver os famosos olhos azuiz - ao contrário do que disse certo obituário nacional, os mais famosos olhos azuis do show biz eram de Sinatra, tanto é que esse era seu apelido - a dona caiu dura no meio da rua. Vidal e Newman aproveitaram a confusão para cair fora dali.
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Na foto, capa da GQ do ano passado que elegeu Paul Newman um dos caras mais estilosos dos últimos 50 anos.
Um comentário:
Na verdade, eu invejo a vida dele.
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